Brasil do agro cercado por fogo e sufocado por fumaça

O interior paulista pegou fogo nas últimas 48 horas em intensidade nunca antes registrada, provocando uma série de consequência ambientais, sanitárias e socioeconômicas. A fumaça produzida juntou-se com a das queimadas que há semanas destroem a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal.

Brasil do agro cercado por fogo e sufocado por fumaça
Incêndio na região de Votuporanga (SP). Reprodução: Defesa Civil

Por Redação

O interior paulista pegou fogo nas últimas 48 horas em intensidade nunca antes registrada, provocando uma série de consequência ambientais, sanitárias e socioeconômicas. A fumaça produzida juntou-se com a das queimadas que há semanas destroem a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal, produzindo um cenário assustador. Céu com tom avermelhado e carregado de partículas tóxicas. Este acontecimento é mais um sinal de alerta da urgência da questão ambiental e de como os governos e as classes dominantes têm falhado em enfrentar as mudanças climáticas.

O estado de São Paulo registrou 2.316 focos de incêndio entre quinta e sexta-feira (23/8), segundo dados do Programa Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Um aumento expressivo comparado aos 352 focos para todo o mês de agosto de 2023. No ano passado, durante todo o ano, foram registrados 1.666 focos de incêndio no estado paulista.

As cidades e regiões mais afetadas pelo fogo sofreram restrições, como a suspensão de aulas, paralisação da operação de linhas de ônibus,  evacuação de fábricas e interdição de 17 rodovias. Em Urupês, região de São José do Rio Preto, dois trabalhadores que atuavam na brigada de incêndio morreram em ação.

O Centro de Gerenciamento de Emergências da Defesa Civil de São Paulo tem alertado para o risco de incêndio desde o dia 15 de agosto. Isto é, uma semana antes dos incêndios que atingiram pelo menos 20 cidades do estado. Portanto, a situação não era desconhecida pelo governador Tarcísio de Freitas, que tomou a iniciativa de criar um gabinete de crise para atuar nas queimadas somente após o interior do estado pegar fogo. Uma letargia que não é notada quando o assunto é mobilizar a Polícia Militar para reprimir, torturar e assassinar a população pobre, negra e periférica, como na operação escudo.

A Defesa Civil estadual divulgou os mapas de risco de incêndio no estado de São Paulo entre os dias 15 e 19 deste mês. Reprodução: Defesa Civil.

Segundo a Defesa Civil, neste sábado (24), trinta cidades estão em alerta máximo devido a focos ativos de  incêndio, baixa umidade relativa do ar e onda de calor: Alumínio, Araraquara, Bernardino de Campos, Boa Esperança do Sul, Dourado, Iacanga, Itirapina, Itápolis, Jaú, Lucélia, Monte Alegre do Sul, Monte Azul Paulista, Nova Granada, Piracicaba, Pirapora do Bom Jesus, Pitangueiras, Poloni, Pompeia, Pontal, Presidente Epitácio, Sabino, Salmourão, Santo Antônio da Alegria, Santo Antônio do Aracanguá, Sertãozinho, São Bernardo do Campo, São Simão, Taquarituba, Torrinha e Ubarana.

As queimadas que ocorreram no interior do estado de São Paulo compõem o cenário trágico e criminoso de incêndios no Brasil em 2024. No primeiro semestre, 4,48 milhões de hectares foram queimados no país, segundo dados do MapBiomas. Os incêndios na Amazônia, Cerrado e Pantanal foram de tal proporção que produziram fumaça em quantidade para locomover na atmosfera no mesmo caminho dos “rios voadores”.

Ao invés de água, o ar veio carregado de carbono tóxico, com potencial danoso para a saúde.  Segundo o epidemiologista e pesquisador da Fiocruz Amazônia, Jesem Orellana,“Esses contaminantes [da fumaça carregada de micro partículas]  geram reação inflamatória e podem até prejudicar nossa resposta imunológica. Entre os efeitos diretos estão a tosse seca, sensação de falta de ar, irritação dos olhos e garganta, congestão nasal ou alergias na pele. Podem agravar doenças respiratórias pré-existentes como rinite, asma, bronquite, doença pulmonar obstrutiva crônica ou mesmo Síndrome Respiratória Aguda Grave”.

Muito é falado sobre a questão ambiental e mudanças climáticas pelos governos, pela mídia e pela burguesia. No entanto, poucas medidas são efetivas. Em um curto período de tempo, o Brasil é palco de eventos climáticos extremos, como secas e inundações, combinado com ações criminosas, como os incêndios. Não há perspectiva de melhoras. No estado de São Paulo, ainda há risco elevado de queimada nos próximos dias e há risco de escassez de água em diversas cidades.

Mapa de Risco de Incêndio para o estado de São Paulo. Reprodução: Defesa Civil.

A situação não tem saída positiva somente com ações para “apagar incêndio”. É necessário enfrentar as causas das mudanças climáticas. No Brasil, a principal contribuição para o aquecimento global vem da mudança do uso do solo, da transformação da vegetação nativa em pastos e lavouras através de queimadas e desmatamentos. Uma dinâmica que remonta ao período colonial, mas que ganhou impulso nos últimos 40 anos com o autodenominado “agronegócio”, destruindo mais de 110 milhões de hectares de vegetação nativa. Os beneficiários são poucos brasileiros e algumas empresas nacionais e estrangeiras do agronegócio. Os prejudicados são milhões.