Bancários: A Campanha salarial de 2024 e a importância de uma oposição sindical combativa
As negociações entre o comando da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro, Contraf/CUT, e a Federação Nacional dos Bancos, Fenaban, culminaram em um dos acordos mais rebaixados da última década.
Iniciada em 18 de Julho deste ano, a campanha salarial dos bancários durou mais de dois meses, contando com um comando desagregado de sua base e uma mesa de negociações teatral, o que beneficiou o patronato. O resultado foi a assinatura de um acordo rebaixado.
As negociações entre o comando da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro, Contraf/CUT, e a Federação Nacional dos Bancos, Fenaban, culminaram em um dos acordos mais rebaixados da última década. O Acordo Coletivo de Trabalho, ACT, foi anunciado pela Contraf/CUT como positivo, mas, na realidade, contou com a rejeição de grande parte dos estados da federação e gerou, durante a campanha, grandes impasses entre a direção sindical (Contraf/CUT e aliados) e a base de bancários.
As contradições entre a base bancária e as entidades sindicais se evidenciaram tanto na falta de comunicação das direções em relação às mesas de negociações, quanto nos momentos de mobilizações efetivas. Nesse sentido, a falta de assembleias após as sucessivas mesas de negociações deixou a base desinformada, além de desencorajar a categoria. Durante a campanha, o comando não sinalizou com nenhum ato que trouxesse uma pressão efetiva contra a Fenaban, limitando-se a um “tuitaço”, o que não causou nenhum impacto sobre o setor financeiro.
Nessa campanha de desmobilização da categoria bancária, as entidades sindicais aliadas à Contraf/CUT utilizaram de retóricas oportunistas, fazendo uma campanha de convencimento nas unidades de que a categoria não teria força para realização de uma greve devido a correlação de forças desfavorável no congresso e às novas tecnologias que possibilitam a realização de serviços remotos e automáticos.
Com a proposta em questão, o reajuste, de 4,64%, da categoria ficou abaixo do reajuste do salário mínimo, de 6,97%, em 2024, mesmo sendo o setor mais lucrativo da economia — que apenas em 2023 obteve um lucro de R$ 145 bilhões (apenas os cinco maiores bancos). Trata-se, portanto, de um dos piores índices de reajuste salarial da história recente: o mísero 0,7% de aumento “real” acima do Índice de Preços ao Consumidor, INPC. Em termos comparativos, segundo o DIEESE, os setores industrial e o de serviços tiveram, respectivamente, aumentos reais de 87,8% e 86,7%.
Além disso, a categoria bancária não dispõe de Planos de Carreira e Salários (PCS) dignos, o que faz com que grande parcela dos trabalhadores fiquem estagnados em cargos e funções sem condições de promoção. Para a parcela concursada recente, as disparidades de direitos são gritantes, tanto em termos salariais, quanto em termos de seguridade, como na falta de planos de saúde com contrapartida de mensalidades por parte dos Bancos na aposentadoria; caso do Banco do Brasil, BB, que não incorpora na aposentadoria o seu plano de saúde, a Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, CASSI.
Segundo dados trazidos em audiência no Senado, em 26 de outubro de 2023, na Comissão de Direitos Humanos (CDH), a categoria bancária, apesar de representar 1% da classe trabalhadora com emprego formal, representa 24% de adoecimento mental, sendo que só em 2012 “o percentual de pessoas que não resistiam à rotina nos bancos e pedia licença em razão de doenças mentais era de 12%”, nos cinco anos seguintes houve um aumento de 26,2%, “enquanto no geral a variação foi de 15,4%”. Ainda segundo os dados, “83% dos afastamentos médicos da categoria têm origem emocional, desde a depressão, ansiedade, às síndromes de burnout (esgotamento físico, mental e emocional) e de pânico”.
O adoecimento da categoria bancária tem raiz no que a categoria denominou de “metas abusivas”, um sistema nomeado pelos Bancos de “produtividade”. As metas abusivas estão relacionadas ao aumento de trabalho com a contínua redução de pessoal, por conta dos planos de desligamento incentivados, PDI’s, e a insuficiente abertura de vagas em concursos públicos.
Desde o início da campanha salarial, a abolição das metas abusivas foi uma das maiores demandas da categoria, um clamor que foi desdenhado pela Fenaban e colocado no esquecimento pelo comando da Contraf/CUT. Essa demanda sequer chegou ao ACT com medidas concretas, limitando-se a promessas paliativas.
Como parte da base de apoio do governo Lula-Alckmin, a Contraf/CUT e aliados, como a Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, CTB, adotaram uma postura de refreamento do movimento sindical, esforçando-se para conter quaisquer tipos de críticas negativas ao governo, contando inclusive com disparos pagos no Instagram onde se anunciava a suposta aceitação geral do acordo rebaixado proposto, o que foi desmentido, na prática, com a deflagração de greves em diversos estados da federação.
Após assembleias que rejeitaram a proposta rebaixada (cerca de 19 estados recusaram a proposta da Fenaban), no caso do BB e Caixa Econômica Federal, deflagraram-se estados de greve e greves em muitas regiões do país, caso de Amazonas, Rio Grande do Norte, Maranhão, Paraíba, Ceará, Rio de Janeiro, Acre e Bahia. Entretanto, as greves foram realizadas por força da base à revelia das direções da Contraf/CUT.
O caso da Bahia é representativo, formou-se uma “oposição sindical bancária” a partir da própria base da categoria, principalmente de trabalhadores do BB e da Caixa, que rejeitaram a proposta rebaixada e exigiram a deflagração da greve, mesmo diante da campanha de desmobilização da Contraf/CUT e do Sindicato dos Bancários da Bahia.
No caso do BB, além do reajuste rebaixado, a cláusula 17, incluída no acordo específico do Banco, colocava em xeque a estabilidade do emprego, pois facilitava a “demissão sem justa causa”, e isso foi suficiente para a base se rebelar, entrando em greve no dia 13 de setembro, com adesão da maioria dos trabalhadores. Por força dessa mobilização, a cláusula 17 foi derrubada e a greve, por falta de adesão de outros bancos, foi encerrada na assembléia do dia 16 de setembro.
Além disso, houve retaliação do BB em estados que rejeitaram a proposta. No dia 13 de setembro, houve estorno da PLR (Participação nos Lucros e Resultados) de funcionários do Maranhão, Rio Grande do Norte e outros estados que rejeitaram o ACT. Essa medida se caracterizou como retaliação e, no dia seguinte, a Justiça do Trabalho, em decisão favorável ao Sindicato dos Bancários do Maranhão, determinou a devolução dos valores aos trabalhadores, por violação do acordo coletivo e dos direitos da categoria.
O movimento espontâneo de mobilização da base de bancários à revelia das direções sindicais pelegas na campanha de 2024 já nos apontou para um horizonte de construção de uma oposição sindical sólida e orgânica com a base.