Balanço de seis meses de trabalho
O boletim mensal do copeque operário mostrará a todos e a cada um como é que os operários de todos os cantos da Rússia sacodem a sua indiferença e o seu torpor, como é que eles despertam para uma vida intelectual, razoável, não no sentido formal ou liberal destas palavras.
Nota Editorial
O artigo de Lênin abaixo é um artigo que foi publicado no Pravda em 1912. Vale a pena mencionar, em alguns pontos, o que esse período significava para o movimento revolucionário na Rússia.
Em primeiro lugar, era o momento de consolidação do Partido Bolchevique como um partido em separado, e não mais como uma fração do Partido Operário Social-Democrata da Rússia. Em janeiro de 1912, os camaradas finalmente removeram os mencheviques e otzovistas do Partido, que, desde 1909, vinham defendendo as posições liquidacionistas combatidas pelos bolcheviques. Depois de mais de uma década da conformação do que era conhecido como “social-democracia” na Rússia – isso é, o movimento marxista organizado – os bolcheviques davam um salto sem precedentes, que foi uma das bases para sua vitória em 1917.
Em segundo lugar, é fundamental observarmos a atenção que Lênin dá ao desenvolvimento prático do trabalho com o jornal. As considerações de ordem ideológica-editorial estão subjacentes e até mencionadas diretamente, mas o foco do artigo é tentar compreender o que o sucesso de vendas e assinaturas do jornal queria efetivamente demonstrar do vínculo e conexões com o proletariado. O controle de edições e recolhimentos de doações foi o foco do balanço apresentado pelo camarada.
Por fim, é importante tomarmos a própria situação política russa como pano de fundo: o começo de algumas mínimas aberturas democráticas era também o solo fértil sobre o qual a política revolucionária pôde se desenvolver com maiores liberdades, inclusive com a participação nas eleições da Duma. Nesse cenário, o combate de Lênin – com o Pravda com um dos principais instrumentos – era tanto contra o liberalismo liquidacionista quanto o revolucionarismo otzovista.
Por V. I. Lênin
Ao fundar um diário operário, os trabalhadores de Petersburgo realizaram uma obra que se pode, sem exagero, qualificar como histórica. A democracia operária fortaleceu-se e cimentou-se em condições particularmente difíceis. Evidentemente, não se trata de falar da solidez da imprensa democrática entre nós. Toda a gente sabe perfeitamente as perseguições que sofrem os jornais operários.
Sendo assim, a fundação da Pravda é uma prova notável da consciência, da energia e da coesão dos operários russos.
É útil lançar uma vista de olhos retrospectiva e examinar alguns resultados de seis meses de trabalho dos operários russos para criar a sua própria imprensa. Precisamente desde Janeiro último, o interesse manifestado pelos meios operários de Petersburgo pela sua imprensa afirmou-se definitivamente, e viu-se aparecer uma série de artigos sobre o diário operário nos órgãos de todas as matizes tendo alguma relação com o mundo operário.
I
Por felicidade, possuem-se informações relativamente completas sobre a questão de saber quem criou e como foi criada a imprensa operária diária na Rússia. Trata-se das coletas de fundos para o diário operário.
Comecemos pelas que permitiram fundar a Pravda: Dispomos dos relatórios da Zvezdá da Nevskaia Zvezdá[2] e da Pravda de exatamente seis meses, de 1 de Janeiro a 20 de Junho. Graças à publicidade que lhe foi feita, estas listas são absolutamente exatas: os erros fortuitos eram imediatamente corrigidos por indicação das pessoas interessadas.
O mais importante e o mais interessante para nós, não é a soma total das coletas, mas a característica dos doadores. Quando, por exemplo, a Nevskaia Zvezdá no seu número 3, traça o balanço geral das coletas e indica a soma total de 4288 rublos e 84 copeques recolhidos para um diário operário (de Janeiro a 5 de Maio, não incluindo as coletas chegadas diretamente à Pravda a partir de 22 de Abril, data do seu aparecimento), pomos imediatamente a nós próprios a questão seguinte: que papel desempenharam os próprios operários e grupos operários na coleta desta soma? É produto de grandes contribuições de simpatizantes? Ou então os próprios operários deram prova, neste domínio, de um vivo interesse pessoal em relação à imprensa operária e obtiveram uma soma importante graças às contribuições de um grande número de grupos operários?
Do ponto de vista da iniciativa, da energia dos próprios operários, 100 rublos recolhidos, digamos por 20 grupos de operários, são infinitamente mais importantes do que 1000 rublos coletados por dezenas de “simpatizantes”. Um jornal fundado com os tostões juntos por pequenos círculos operários nas oficinas e fábricas tem uma base muito mais sólida, mais durável, mais séria (sob o ponto de vista financeiro – e coisa primordial – do ponto de vista do desenvolvimento da democracia operária) do que um jornal criado com dezenas e centenas de rublos entregues por simpatizantes intelectuais.
A fim de ter dados precisos sobre esta questão fundamental e de máxima importância, examinamos os números publicados nos três jornais indicados. Fixámo-nos apenas nas coletas feitas de certeza por grupos de operários e empregados.
O que nos interessa presentemente são as coletas feitas pelos próprios operários, não por operários isolados que encontraram por acaso a pessoa que recolhia coletas, mas cujas ideias e convicções não compartilham, mas precisamente por grupos operários que, de certeza, discutiram primeiramente para saber se convinha dar o dinheiro, a quem o dar, com que objetivo.
Todas as vezes que a Zvezdá, a Nova Zvezdá e a Pravda indicam que se trata de um grupo de operários ou de empregados que entregaram o dinheiro para um diário operário, anotamos uma coleta de grupo dos próprios operários.
Quantas coletas deste gênero houve, então, no primeiro semestre de 1912?
Quinhentas e quatro coletas de grupos!
Mais de quinhentas vezes, os operários fizeram em grupo donativos para fundar e apoiar o seu jornal: quer seja o produto de um dia de trabalho, quer sejam contribuições únicas, ou ainda contribuições escalonadas. 504 grupos operários sem contar com os operários e simpatizantes individuais, tomaram parte bastante ativa na fundação do seu jornal; este número indica, sem sombra de dúvida, que no seio das massas operárias, levantou-se um interesse profundo e consciente pelo jornal operário, não por um jornal operário qualquer, mas sim por um jornal operário democrático. Uma vez que uma tal atividade e uma tal consciência existem nas massas, não há dificuldades, não há obstáculos que sejam de temer. Não há e não pode haver dificuldades e obstáculos que a consciência, a atividade e o interesse das massas operárias não sejam capazes de ultrapassar de uma maneira ou de outra.
Estas 504 coletas de grupos repartem-se mensalmente da forma seguinte:
Janeiro de 1912 - 14
Fevereiro de 1912 - 18
Março de 1912 - 76
Abril de 1912 - 227
Maio de 1912 - 135
Junho de 1912 - 34
Total de um semestre - 504
Este pequeno quadro mostra claramente todo o significado das jornadas de Abril e de Maio que marcaram uma viragem. Uma viragem que passa das trevas para a luz, da passividade para a atividade, das ações individuais para as ações de massas.
Em Janeiro e Fevereiro as coletas de grupos operários são absolutamente insignificantes. É evidente que o movimento acaba de nascer. Em Março, a subida já é nítida, sensível. Setenta e seis coletas de grupos operários, isso atesta, seja como for, um movimento sério entre os operários, a vontade persistente das massas de levar a melhor custe o que custar, sem recear os sacrifícios. Isso indica a confiança profunda das massas operárias nas suas próprias forças, no modo como é organizado o assunto, na orientação do jornal, e assim sucessivamente. Em Março, o diário operário ainda não existia: os grupos operários juntavam o dinheiro e remetiam-no à Zvezdá, dando-lhe, por assim dizer, crédito.
Abril marca de repente o impulso gigantesco que decide a questão. 227 coletas de grupos operários num mês, ou seja mais de sete coletas por dia, em média! O dique rompeu-se, o diário operário está assegurado. Cada colecta de grupo não significa somente uma soma em copeques, significa alguma coisa infinitamente mais importante: uma soma de energia comum, massiva, a vontade dos grupos de apoiar o jornal operário, de difundi-lo, de orientá-lo, de criá-lo pela sua própria participação.
Pode-se perguntar se, em Abril, as coletas não terão predominado depois do dia 22, isto é, depois do aparecimento da Pravda. Não. Antes de 22 de Abril, a Zvezdá anuncia 188 coletas de grupos. A Pravda assinala 39 coletas de grupos, de 22 de Abril até ao fim do mês. Portanto, de 1 a 21 de Abril, antes do aparecimento da Pravda contam-se 9 coletas por dia em média e somente 4 coletas por dia durante os 9 últimos dias de Abril.
Decorrem daí duas importantes conclusões:
Em primeiro lugar, os operários manifestaram maior energia precisamente antes do aparecimento da Pravda. "Concedendo crédito", confiando na Zvezdá, os operários exprimiam a sua vontade de atingir os seus objectivos.
Seguidamente, e isso mostra que é mesmo o impulso de Abril dos operários que criou o jornal operário Pravda. Está fora de dúvida que existe uma estreita ligação entre a subida geral do movimento operário (não sob uma forma estritamente corporativa, profissional, mas à escala do povo inteiro) e a criação do órgão diário da democracia operária de Petersburgo. As publicações sindicais não nos bastam, temos necessidade do nosso próprio jornal político, eis o sentimento que amadureceu na consciência das massas durante estas jornadas de Abril; temos necessidade, não de qualquer jornal operário político, mas de um jornal de democracia operária avançada; temos necessidade dele não só para apoiar a nossa luta operária, mas para dar um modelo e um guia a todo o povo.
No mês de Maio, o impulso é ainda bastante acentuado. Contam-se, em média, mais de quatro coletas de grupos por dia. Por um lado, encontra-se aí a subida geral de Abril e Maio. Por outro lado, as massas operárias apercebem-se de que, embora o diário tenha já começado a aparecer, a sua situação é de início particularmente difícil: o apoio dos grupos é particularmente indispensável.
Em Junho, o número de coletas de grupos é inferior ao que era em Março. Naturalmente, é preciso ter em consideração o facto de que, depois do aparecimento do diário operário, nasceu uma outra forma de ajuda ao jornal que se revestiu de um alcance decisivo, a saber: a assinatura e a difusão entre os camaradas, os conhecimentos, as regiões, etc. Todos os amigos conscientes da Prada não se contentam em assinar somente eles próprios, distribuem-na e enviam-na como modelo para dá-la a conhecer noutras fábricas, nos alojamentos e nas casas vizinhas, na aldeia e por aí adiante. Infelizmente, não podemos ter uma estatística completa deste gênero de ajuda colectiva.
II
É extremamente instrutivo examinar como se repartem estas 504 coletas de grupos operários por cidades e povoações operárias. Em que localidades da Rússia e com que energia os operários responderam ao apelo para fundar um jornal operário diário?
Felizmente, possuem-se estas informações para todas as coletas de grupos operários anunciadas pela Zvezdá, a Nevskaia e a Pravda.
Quando se faz o balanço, vê-se imediatamente que Petersburgo esteve, naturalmente à cabeça do movimento para a criação de um jornal operário petersburguês; vem seguidamente 14 cidades e povoações operárias onde as coletas foram feitas por mais de um grupo operário, e enfim todas as outras cidades, em número de 35, que forneceram cada uma, em seis meses, coletas de um único grupo operário. Obtém-se o quadro seguinte:
Número total de coletas feitas por grupos
Petersburgo - 412
14 cidades (2 a 12 coletas) - 57
35 cidades (1 colecta) - 35
Total de 50 cidades - 504
Depreende-se assim que quase toda a Rússia tomou parte mais ou menos activa na fundação do diário operário. Se se pensa em todas as dificuldades que a difusão da imprensa democrática operária enfrenta na província, fica-se impressionado pelo grande número de cidades que responderam, em seis meses, ao apelo dos operários de Petersburgo.
Noventa e duas coletas de grupos operários para 49 cidades da Rússia[3] sem contar com a capital, é um número muito impressionante, pelo menos no princípio. Neste caso, não se trata de doadores ocasionais, indiferentes, passivos: é certo que estamos em presença de representantes das massas proletárias através de toda a Rússia, mas unidos por uma simpatia consciente em relação à democracia operária.
Reparemos que Kiev vem à cabeça das cidades de província (12 coletas), a seguir Ekatérinoslav (8 coletas) e que Moscovo ocupa apenas o 40 lugar (6 coletas). Este atraso da cidade e de toda a região de Moscovo aparece ainda mais claramente nos números de conjunto para todas as regiões da Rússia:
Número de coletas efetuadas por grupos de operários para um diário operário durante seis meses, Janeiro – Junho de 1912
Petersburgo e arredores - 415
Sul - 51
Cidade e região de Moscovo - 013
Norte e Oeste - 12
Ural e região do Volga - 6
Cáucaso, Sibéria, Finlândia - 7
Total de toda a Rússia - 504
Estes números podem ser interpretados da seguinte maneira: do ponto de vista da recrudescência da atividade da democracia operária na Rússia, Petersburgo proletário despertou já, entra valentemente de guarda. O Sul desperta. E a velha Moscovo, com o resto da Rússia, está ainda mergulhada no sono. Seria tempo de começar também a despertar.
O atraso de toda a região de Moscovo aparece quando é comparada com as outras regiões provincianas. O Sul está mais afastado de Petersburgo e bastante mais do que Moscovo. E contudo, embora tenha menos operários industriais do que a região de Moscovo, o Sul ultrapassa quase quatro vezes no número de coletas efetuadas por grupos de operários.
Moscovo atrasa-se aparentemente mesmo em relação ao Ural e à região do Volga, porque o número de operários na cidade e região de Moscovo ultrapassa em muito mais do dobro o do Ural e da região do Volga. E, no entanto, contam-se aí ao todo 13 coletas de grupos contra 6 no Ural e na região do Volga.
Evidentemente, duas condições particulares exercem uma influência no atraso de Moscovo e da sua região. Em primeiro lugar, o que lá predomina é a indústria têxtil. Ora, a conjuntura, isto é, as condições do mercado e a animação maior ou menor da produção, não era tão boa como na metalurgia, por exemplo. É por isso que os operários do sector têxtil participaram menos nas greves, interessaram-se menos pela política e pela democracia operária. E além disso, na região de Moscovo, há mais fábricas dispersas em recônditos perdidos onde o jornal tem mais dificuldade em penetrar do que numa grande cidade.
Em todo o caso, o que se retira dos números citados, para todos nós, é evidente. A mais firme atenção deve ser dada à difusão do jornal operário em Moscovo. Não se poderia admitir o atraso de Moscovo. Todo o operário consciente compreende que Petersburgo sem Moscovo, é como uma das mãos sem a outra.
A massa preponderante dos operários das grandes oficinas e fábricas da Rússia está concentrada na cidade e na região de Moscovo. Em 1905, por exemplo, contavam-se aí, segundo as estatísticas do próprio governo, 567 000 operários industriais, ou seja, mais de um terço do seu número total na Rússia (1 660 000), muito mais do que na circunscrição de Petersburgo (298 000). Por esta razão, a região de Moscovo é chamada a ocupar o primeiro lugar quanto ao número dos leitores e amigos do jornal operário, ao número dos representantes conscientes da democracia operária. Moscovo deverá, certamente, pôr de pé o seu próprio diário operário.
De momento, Petersburgo deve dar-lhe ajuda. Os leitores da Pravda devem dizer todas as manhãs a si próprios e aos seus amigos: "Operários, pensem nos moscovitas"'.
III
Os números citados devem ainda reter a nossa atenção sob um outro ponto de vista, muitíssimo importante e de uma atualidade abrasadora. Cada qual compreende que um jornal político é uma das principais condições da participação de uma classe, qualquer que seja ela, na vida política do país em geral, nomeadamente na campanha eleitoral.
Assim, os operários têm geralmente necessidade de um jornal, e em particular, para a campanha eleitoral à IV Duma. Os operários sabem perfeitamente que não podem esperar nada de bom, nem da Ill nem da IV Duma; mas devemos participar nas eleições, primeiramente para unir e educar politicamente as massas operárias durante as eleições, época em que a luta dos partidos e de toda a vida política conhecem um recrudescer de atividade, em que as massas iniciam-se na política de uma maneira ou de outra; e depois, para conseguir eleger os seus deputados operários à Duma. Mesmo na Duma mais reacionária, puramente feudal, os deputados operários trouxeram e podem ainda trazer não poucos benefícios à classe operária, se estão ligados às massas, e se as massas aprendem a dirigi-los, a controlá-los.
Durante o primeiro semestre de 1912, todos os partidos políticos na Rússia começaram e terminaram já, em suma, o que se chama a mobilização eleitoral de forças. Mobilização é um termo militar que significa: pôr as tropas em pé de guerra. No mesmo modo que na véspera das hostilidades, põem-se as tropas em pé de guerra, chama-se a reserva, distribui-se armas e munições, também na véspera das eleições, todos os partidos traçam o balanço da sua actividade, confirmam as suas decisões respeitantes às concepções e palavras de ordem do Partido, juntam as suas forças, preparam-se para a luta contra todos os outros partidos.
Este trabalho, repetimo-lo, está virtualmente acabado. Restam algumas semanas até as eleições; durante este lapso de tempo, pode-se e deve-se encaminhar as forças para acentuar a influência nos eleitores, nas massas; mas se o próprio partido (o de cada classe) não se preparou durante o semestre, tudo será vão, não será mais do que um zero nas eleições.
É por isso que o semestre examinado nas nossas estatísticas é o da mobilização resoluta das forças operárias na véspera das eleições para a IV Duma. Este semestre é o da mobilização de todas as forças da democracia operária não só no que diz respeito à luta parlamentar, como é óbvio; por agora, contudo, dedicamos a nossa atenção a esta última.
A este respeito, coloca-se uma questão recentemente levantada no no 16 da Nevskaia Zvezdá e no n° 61 da Pravda. Trata-se daquilo a que se chama os liquidacionistas, que publicam, em Petersburgo, desde Janeiro de 1912, os jornais Jivoié Diélo [4] e Nevski Goloss [5]. Os liquidacionistas, que possuem os seus próprios jornais, dizem que para realizar a unidade da democracia operária nas eleições, é preciso um acordo com eles, liquidacionistas, e querem meter-nos medo, agitando o espectro das "duplas candidaturas"[6].
Parece bem que estas tentativas de intimidação têm tido até ao presente muitíssimo pouco sucesso.
É fácil de compreender. Pode-se contar com pessoas justamente qualificadas como liquidacionistas e promotoras de uma política operária liberal?
Mas pode ser que um grande número de operários compartilhem mesmo assim estas concepções erradas, contrárias à social-democracia, deste grupo de intelectuais? Não será então conveniente prestar uma particular atenção a estes operários? Para responder a esta questão, dispomos presentemente de dados objetivos, públicos e perfeitamente exatos. Durante toda a primeira metade de 1912, os liquidacionistas, como se sabe, atacaram com particular energia a Pravda a Nevskaia Zvezdá e a Zvezdá e, de uma maneira geral, todos os adversários da corrente liquidacionista.
Qual é então o êxito dos liquidacionistas entre os operários? As coletas a favor de um diário operário, anunciadas pelos jornais liquidacionistas Jivoié Diélo e Nevski Goloss, testemunham-no. Os liquidacionistas reconheceram há muito a necessidade de um diário, desde 1911, ou mesmo 1910, e, com todas as suas forças, pregaram esta ideia entre os seus adeptos. O Jivoié Dielo que aparece desde 20 de Janeiro de 1912 começou a publicar, a partir de Fevereiro, informações sobre as quantias que recolheu para este objectivo.
Ponhamos à parte nestas coletas (cujo montante para os seis primeiros meses de 1912 atinge 139 rublos e 27 copeques) as dos grupos operários, exatamente como fizemos para os jornais não-liquidacionistas. Façamos o balanço dos 16 números de Jivoié Diélo e dos 5 números de Nevski Goloss (cujo n°6 apareceu em Julho); juntemos-lhe também as coletas destinadas a apoiar o próprio Jivoié Diélo (embora não tivéssemos em conta informações sobre estas coletas aparecidas nos jornais não-liquidacionistas). Obtém-se o quadro seguinte sobre o número total de coletas dos grupos operários durante seis meses:
Número de coletas efetuadas por grupos operários para um diário operário durante o primeiro semestre de 1912
Assim, durante um semestre, os esforços desesperados de um círculo de intelectuais liquidacionistas conseguiram assegurar o apoio de 15 grupos operários ao todo e para tudo!
Pode-se imaginar uma derrota mais completa dos liquidacionistas desde Janeiro de 1912? Pode-se imaginar uma demonstração mais exata do fato de estarmos em presença de um círculo de intelectuais liquidacionistas, capaz de publicar uma revista e um jornal semi-liberais, mas absolutamente privado de um apoio massivo, mesmo que pouco sério, entre o proletariado?
Eis ainda os números sobre a repartição por regiões das coletas recolhidas pelos liquidacionistas:
Número de coletas efetuadas por grupos operários para um diário operário durante o primeiro semestre de 1912
Assim, no Sul, a derrota dos liquidacionistas durante estes seis meses é ainda maior do que em Petersburgo.
Estes números exactos das estatísticas operárias, tornadas públicas durante um semestre inteiro por jornais de orientações contrárias, resolvem definitivamente a questão da "corrente liquidacionista". Pode-se insultar tanto quanto se queira os seus adversários, caluniá-los, os números exactos sobre as colectas dos grupos operários são irrefutáveis.
A partir daí, compreende-se perfeitamente porque é que nem a Nevskaia Zvezdá nem a Pravda tomaram a sério a ameaça de apresentar "'duplas candidaturas" lançada pelos liquidacionistas. Teria sido ridículo tomar a sério ameaças provenientes de pessoas que em seis meses de luta aberta revelaram que eram um pouco mais do que nada. Todos os defensores da corrente liquidacionista agruparam-se na Jivoié Diélo e no Nevski Goloss. E todos juntos, em seis meses, atraíram para os seus lados 15 grupos operários!
No movimento operário, a corrente liquidacionista não é nada; só é forte entre os intelectuais liberais.
IV
Os números relativos às coletas de todo o gênero publicadas na Pravda são, de um modo geral, extremamente interessantes. Pela primeira vez, temos dados de elevada precisão sobre os mais diferentes aspectos do movimento operário e da vida dos democratas operários russos. Esperamos ter ainda ocasião de analisar mais uma vez estas estatísticas.
Por agora, no fim deste exame dos números relativos às coletas dos grupos operários para o nosso diário, devemos extrair uma conclusão prática.
Os grupos operários fizeram 504 coletas para a sua imprensa que entregaram à Zvezdá e à Pravda. Os operários não tinham absolutamente nenhum outro objectivo, a não ser criar e apoiar a sua imprensa operária. É precisamente por esta razão que o simples resumo fiel destes dados de um semestre oferece um quadro extremamente precioso da vida da democracia operária na Rússia. Os copeques reunidos, acompanhados por uma nota: “Da parte do grupo operário de tal fábrica”, permitiram julgar o estado de espírito dos operários e o grau da sua consciência, a sua coesão, a sua dedicação à causa operária.
É por isso que é absolutamente necessário prosseguir, alargar o hábito das coletas de grupos operários, nascido com entusiasmo de Abril e Maio; evidentemente, os relatórios destas coletas, como aqueles que a Pravda sempre publicou, são indispensáveis.
Que se trate da estabilidade da imprensa operária ou dos interesses gerais da democracia operária, este hábito é de uma importância extrema.
A imprensa operária deve ser desenvolvida, deve ganhar força. Para este efeito, é preciso dinheiro. Somente as coletas permanentes e massivas entre os Operários podem permitir, por um trabalho persistente, pôr de pé de uma maneira satisfatória jornais operários na Rússia. Na América existe um jornal operário (Appeal to Reason) [7] que tem mais de meio milhão de assinantes. Reles será o operário russo, diríamos, parafraseando um provérbio russo muito conhecido, que não espera alcançar e ultrapassar o seu colega americano.
Porém, um outro aspecto da questão, que não o lado financeiro, é infinitamente, incomparavelmente mais importante. Suponhamos que cem operários das oficinas de uma fábrica, entregam cada qual um copeque da sua féria para o jornal operário. Isso dará ao todo dois rublos por mês. Suponhamos, por outro lado, que dez operários bem pagos se encontram por acaso e juntam de repente dez rublos.
Os primeiros dois rublos são mais preciosos do que estes dez rublos. E de tal modo evidente para todo o operário que são inúteis aqui longas explicações.
É preciso que cada operário, em cada pagamento de salário, entregue um copeque para o jornal operário. Isso deve tornar-se um hábito. Que as assinaturas continuem como antes, que aqueles que podem dar mais continuem a fazê-lo. O essencial é adquirir e propagar, o hábito de entregar "um copeque para o jornal operário".
O que fará a importância destas coletas, será a sua regularidade a cada pagamento, sem interrupções, e é a participação de um número sempre mais elevado de operários nestas coletas permanentes. Os relatórios na imprensa poderiam ser simples: "tantos copeques" significaria que outros tantos operários da fábrica citada efectuaram entregas para o jornal operário; seguidamente, no caso em que houvesse contribuições mais importantes, poder-se-ia acrescentar: "além disso, tantos operários entregaram tal soma".
Se se propaga o hábito de entregar um copeque para o jornal operário, os operários russos não tardarão a elevar os seus jornais materiais e de maior diversidade, suplementos de domingo, etc.; deve ter os seus correspondentes quer na Duma quer em todas as cidades da Rússia bem como nas maiores cidades do estrangeiro. O jornal operário deve desenvolver-se e melhorar constantemente, o que é impossível sem coletas permanentes, de um número tão elevado quanto possível de operários, para os seus órgãos de imprensa.
O boletim mensal do copeque operário mostrará a todos e a cada um como é que os operários de todos os cantos da Rússia sacodem a sua indiferença e o seu torpor, como é que eles despertam para uma vida intelectual, razoável, não no sentido formal ou liberal destas palavras. Poder-se-á claramente ver como é que cresce o interesse pela democracia operária, como é que se aproxima o dia em que Moscovo, bem como todas as grandes cidades terão os seus jornais operários.
Estamos fartos da ação do Kopeck [8] burguês! Esta folha de couve mercantil, sem princípios, reinou já o suficiente. Os operários de Petersburgo mostraram em cerca de seis meses o êxito imenso que podem ter as coletas operárias. Que a sua iniciativa, o seu exemplo não sejam vãos. Um copeque operário para o jornal operário! Que este hábito se reforce e se torne geral.
[1] O artigo “Balanço de seis meses de trabalho” foi escrito na primeira quinzena de Julho de 1912. A correspondência entre Lênin e a redação da Pravda, a respeito da publicação este artigo foi conservada. Lênin propunha que a Pravda publicasse o artigo em 4 números como rubrica separada e apenas consentia nas correções da censura. O artigo foi publicado na Pravda tal como Lênin propunha.
Redigido de 12 a 14 (25-27) de julho de 1912. Publicado em 29 e 31 de julho e 1 e 2 de agosto de 1912, na Pravda nºs 78, 79, 80 e 81. Assinado: O Estatístico.
Obras, tomo 18. Ed. Sociais, Paris e Ed. Progresso, Moscovo
[2] “NEVASKAIA ZVEZDÁ” (a Estrela do Neva) – jornal bolchevique legal editado em Petersburgo de 26 de fevereiro (10 de março) a 5 (18) de Outubro de 1912. Apareceram 27 números. Inicialmente a “Nevskaia Zvezdá” saiu ao mesmo tempo que o jornal “Zvezdá” e devia substituí-lo em caso de suspensão ou confisco/ depois de 22 de abril (5 de maio) de 1912, apareceu no lugar do “Zvezdá” suprimido. Publicou 20 artigos de Lênin.
[3] Eis a lista completa de cidades e povoações. ARREDORES DE SÃO PETERSBURGO: Kronstadt, Kolpino and Sestroretsk. SUL: Kharkov – 4 coletas de grupos; Ekatérinoslav – 8; Ananyev – 2; Lugansk – 3; Kherson, Rostov-on-Dan, Pavlograd, Poltava; Kiev – 12; Astrakhan – 4; Chernigov, Yuzovka – 3; Minakovo, minas de Chtcherba, de Rykov, Belgorod, Yelisavetgrad, Yekaterinodar; Mariupol – 2; Nizhne-Dneprovsk, Nakhichevan. REGIÃO DE MOSCOU: Rodniki – 2; Ryazan, Tula – 2; Bezhetsk – 2. NORTE: Archangel – 5; Vologda. OESTE: Dvinsk, Vilna, Gomel, Riga, Lepaya, Mühlgrahen. URAL: Perm, Kyshtym, Minyar, Orenburg. REGIÃO DE VOLGA: Sormovo, povoado de Balakovo. CÁUCASO: Baku – 2; Grozny, Tiflis. SIBÉRIA: Tyumen, Blagoveshchensk. FINLÂNDIA: Helsingfors. (NOTA DO AUTOR)
[4] "JIVOIÉ DIÉLO” (“A Causa Viva") – jornal semanal legal dos mencheviques liquidacionistas; apareceu em S. Petersburgo em 1912; 16 números ao todo.
[5] “NEVSKI GOLOSS” (A Voz do Neva”) – jornal legal dos mencheviques liquidacionistas; apareceu em Petersburgo de Maio a Agosto de 19112.
[6] Lênin alude à ameaça dos mencheviques liquidacionistas de apresentarem as suas próprias candidaturas à IV Duma na cúria operária, para contrabalancear as candidaturas bolcheviques.
[7] “APPEAL TO REASON” (“Apelo à Razão") – jornal dos socialistas estadunidenses, fundado em 1895 na cidade de Girard, no Kansas. Não estando oficialmente ligado ao Partido Socialista Americano, o jornal fazia propaganda das ideias socialistas e gozava de grande popularidade entre os operários.
[8] "JORNAL KOPECK” – jornal diário burguês de tipo sensacionalista. Editado em Petersburgo a partir de 1908. Proibido em 1918.