'Assistência - máquina de moer militante e uma proposta para intercâmbio entre células e núcleos' (Carlos Chaves)
É frequente em nossa organização que es militantes destacades para a tarefa sirvam como bode expiatório para serem culpabilizados pelos problemas da organização enquanto nosssa precária profissionalização segue ilesa a críticas.
Por Carlos Chaves para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.
Escrevo essa pequena tribuna retomando um tópico que apresentei em meu antigo núcleo mas que pode ser de interesse ao debate mais amplo na organização. Anteriormente não havia enviado como tribuna ao Congresso por faltar propostas mais concretas mas agora vejo que é somente socializando tais incômodos, mesmo que sem ter todas as respostas para solucioná-los, que avançamos
Indo ao ponto: A Assistência é uma máquina de moer militante
Descrevendo muito brevemente, é função das assistências servir para intermediar instâncias e/ou organismos do partido, tais camaradas articulam o envio de informações para células e núcleos vindas de instâncias superiores ao mesmo tempo que transmitem os acúmulos de células e núcleos para tais instâncias, também é papel da assistência orientar para que a linha política e ideológica da organização seja coesa, portanto, es assistentes devem acompanhar de perto os trabalhos e desenvolvimentos dos espaços sob sua responsabilidade. Ler atas, acompanhar reuniões, ativos, ter uma comunicação efetiva com secretarias, etc, etc.
Problemas de Assistência
Nossa forma organizativa geral diz que toda comunicação entre instâncias ou organismos do partido deve ser realizada tendo a assistência como mediadora. Tal prática, em sua fundamentação mais ampla é correta, se assenta em boas práticas de divisão de trabalho em um partido leninista. A ideia é que, havendo um camarada responsável por essa comunicação as informações não se percam e possam ser realizadas de forma ágil, dificultando a existência de assimetrias muito grandes entre organismos adquiridas de maneiras informais (amizades, relacionamentos, questões não políticas, etc.).
Contudo, ao darmos um foco maior no trabalho das assistências, vemos que a forma com que lidamos com essa questão se afasta de um maior profissionalismo num partido comunista, pelo contrário, cria espantalhos que freiam nosso avanço em alguns tópicos individualizando problemas gerais da organização na figura de alguns camaradas. É frequente em nossa organização que es militantes destacades para a tarefa sirvam como bode expiatório para serem culpabilizados pelos problemas da organização enquanto nosssa precária profissionalização segue ilesa a críticas.
Vamos a alguns exemplos:
- Determinado núcleo/célula quer realizar uma atividade Política com algum quadro convidado do partido.
a. A assistência é contatada
b. Esbarra na falta de protocolos, capacidade comunicativa ou sobrecarga própria que impede de atender às várias demandas e posteriormente na incapacidade da assistência da outra célula.
c. A atividade não ocorre, camaradas culpam a assistência. - Recrutamento se aproxima de um núcleo/célula mas deveria ser recrutado por outro.
a. É encaminhado para a assistência
b. Assistência esbarra na nossa falta de organização geral para rápida resposta e distribuição de recrutamentos.
c. O Recrutamento não é tocado durante meses, camaradas culpam a assistência - Ocorre alguma coisa, é feita uma crítica a camaradas de outra célula.
a. É repassada para a assistência
b. A assistência esbarra na falta de instâncias e de democracia interna sobre a questão das críticas.
c. Não há nenhum retorno se a crítica foi feita, ou não, camaradas culpam a assistência.
Poderia ficar listando vários outros exemplos mas acho que já deu para entender o ponto.
Da culpabilidade da Assistência e falta de profissionalização
Camaradas na função de assistência cometem erros? Sim! Não há dúvidas sobre isso (assim como camaradas em qualquer outra tarefa). Porém, para além disso, não há uma delimitação bem definida das atribuições da assistência, do nível de profissionalização que a tarefa exige, da quantidade de tempo que camaradas destacades para a função possuem, de quais ferramentas organizativas e comunicacionais dispõem etc. Assim, nos falta inclusive parâmetros para conseguir identificar até onde camaradas destacades para essa função erraram e até onde o que nos falta é uma estrutura melhor e mais profissionalizada e científica na divisão e dimensionamento do trabalho.
Utilizando dos exemplos acima (que vi acontecer na UJC-SP antes do racha), é possível cobrar das assistências? Ou isso tudo é fruto da falta de políticas bem delimitadas de nossa organização? Enquanto olharmos para a organização e instâncias superiores como algo imaculado o que vai “sobrar” é a crítica desproporcional à assistência. Já vi alguns dos melhores quadros de nossa organização quebrarem e/ou estarem muito próximos a isso ao assumirem funções de assistência e isso é inadmissível, dá muito trabalho recrutar, formar, forjar um camarada, para depois quebrarmos elu atribuindo funções humanamente impossíveis de serem praticadas sob o capitalismo.
Assistência é uma função ou é um cargo?
A forma com que assistentes são escolhidos, toda a redundância em relação a estarem nas instâncias de direção, e a total falta de preocupação com profissionalização me faz questionar se as assistências estão servindo como uma função/tarefa para a qual camaradas bem formados são eventualmente destacados para contribuir com a organização OU se a assistência é um cargo, algo “dado” a camaradas de destaque apenas para “testar a sua fé”, a ferro e fogo no interior da organização.
Tal dinâmica gera efeitos psicológicos e desvios emergem, podendo gerar certos mandonismos (tão criticados nos últimos períodos) mas também uma dinâmica de uma “falsa meritocracia”, onde um militante só se sente um verdadeiro comunista se dispõe do tempo e condições de executar trabalhos de direção e posteriormente assistências, mas o trabalho é (des)organizado de tal maneira que apenas militantes que não trabalham, possuem conhecimentos técnicos e facilidades comunicativas além de uma aproximação muito grande com as instâncias de direção consigam fazê-lo sem sacrificar o restante de sua vida.
E o que fazer?
O básico, sempre ele. Se temos uma função sem escopo bem definido, um primeiro passo é ter esse escopo. Tendo o escopo, é necessário dimensionar o trabalho: quantas pessoas são necessárias? Qual disponibilidade as pessoas precisam ter? E a partir disso, irmos refinando os métodos de comunicação e assistência propriamente dito coletivamente.
Para além do básico, é necessário compreender que existem funções que atualmente são atribuídas ou passam pelas assistências que não necessariamente deveriam passar por elus, por exemplo, com o avanço comunicacional e das tecnologias digitais, já somos capazes hoje de ter uma plataforma (app, site, mensageiros, emails etc) onde realizamos convocatórias para atividades gerais de forma generalizada, sem a necessidade e dependência da disponibilidade da assistência, que poderia estar executando uma função política com algo simplesmente organizativo.
Uma outra questão é tornar os canais de dúvidas com as assistências mais abertos, ou seja, que todes camaradas de uma instância saibam quais dúvidas estão sendo tiradas com a assistência e as eventuais respostas, além disso formar mais a militância evitaria a redundância des camaradas terem que responder diversas vezes as mesmas coisas com pequenas variações. Conforme formos avançando nessa política é possível inclusive a criação de um FAQ (perguntas frequentes) que pode descer periódicamente para toda a organização respondendo todas as instâncias de bases sobre as questões mais pertinentes (mesmo para aquelas que ainda não conseguem formular tais perguntas).
Um outro ponto é da socialização dos acúmulos e práticas de um organismo para o todo da organização, essa função deverá seguir sendo da assistência mas poderia ser grandemente incrementada com a criação de “intercâmbios militantes”, onde camaradas são destacados, durante um período de tempo pré-definido, para militar e colaborar com outro núcleo/célula, na perspectiva tanto de levar quanto de trazer acúmulos.
Sobre os “Intercâmbios” entre núcleos
A proposta é que a cada semestre, um camarada possa ser destacado para realizar um intercâmbio em algum núcleo/célula que apresenta disposição em receber alguém novo, tal camarada deve ser destacado pelo coletivo do núcleo/célula e os acúmulos e principais dificuldades políticas e organizativas devem ser sintetizadas em um documento para que e camarada apresente na sua chegada aos espaços de atuação no novo local.
Enquanto estiver atuando no novo núcleo, imagino que o ideal seria 3 meses, e camarada deve buscar atuar ativamente nas tarefas, realizando pequenas sínteses, em sua volta deve elaborar um pequeno documento relatando o que avalia que pode ser melhorado a partir de ambas experiências, tal relatório deve ser apresentado tanto para o núcleo original quanto para o núcleo que recebeu e camarada, fazendo avançar aspectos da organização que não são apenas de ordem política e organizativa mas da cultura política de cada local.
Considerações Finais
Espero que mais camaradas possam contribuir com esse debate e não só com ele mas sobre as atribuições das várias funções e tarefas que seguirão existindo no partido. Peço desculpas pela ausência de tribunas nos últimos meses, algumas questões de ordem pessoal roubaram minha atenção, também avalio que as propostas e críticas apresentadas aqui são muito cruas, assim, peço que quem puder contribuir com esse debate, que o faça.
Há braços