'As tribunas e a (des)organização da polêmica' (Jeadi Frazão)

Se as coisas continuarem como estão, receio a seguinte possibilidade: que o XVII Congresso Extraordinário não resolva nossos problemas político-organizativos, deixando muitos pontos em aberto e abrindo espaço para minguar a nossa prática política durante e após o conclave.

'As tribunas e a (des)organização da polêmica' (Jeadi Frazão)
"Não tenho respostas prontas para solucionar esses problemas, mas acredito que precisaremos pensar neles se quisermos organizar a polêmica na imprensa partidária e, mais que isso, organizar a classe trabalhadora no sentido da Revolução Brasileira e do socialismo-comunismo."

Por Jeadi Frazão para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

No âmbito da organização da polêmica, os organismos dirigentes das organizações com centralismo democrático terão que se engajar em um esforço ativo maior para o convencimento da necessidade de que a polêmica seja feita de forma organizada, pelos meios de circulação “oficiais” como jornais, páginas na internet, sites, mídias sociais – isso porque a tendência ao liberalismo fica fortalecida quando aparente é possível cada militante organizar sua própria rede de circulação. Ao mesmo tempo, se a liberdade de crítica não se opera conforme concebida por Lênin, com a organização da polêmica pública, há um reforço desse liberalismo entre os militantes, que desejam, como qualquer um, expor suas visões sobre o movimento.

No âmbito da intervenção na polêmica, também as organizações leninistas terão desafios: o fluxo aumentado múltiplas vezes de material circulando (e, se bem organizado, sendo publicado nas páginas e sites, jornais e revistas dessas organizações) exige um igualmente grande aumento quantitativo na intervenção teórico-política por parte das direções. Isso porque, com a velocidade possível de circulação de informações, também a velocidade de respostas, réplicas e tréplicas é maior. Se, hipoteticamente, esse fluxo imenso pode ajudar ainda mais a acelerar o amadurecimento teórico-político de uma vanguarda proletária leninista, também tende a exigir mais dos dirigentes leninistas.

(Gabriel Lazzari em “A que herança não renunciamos?” Posfácio à obra O centralismo democrático de Lênin, grifos do autor).

Camaradas, sou militante da UJC em Sergipe desde 2021, tendo sido eleito para a Coordenação Regional e Coordenação Nacional no IX Congresso da UJC. No final do ano de 2022, entrei nas fileiras do PCB, cuja desorganização no estado era tão grande que, na juventude, argumentávamos que a Reconstrução Revolucionária não havia chegado até Sergipe.

Em partes, estávamos certos, mas não sabíamos ainda que o problema era muito maior. Acompanhei atentamente todo o processo de crise partidária que levou à cisão, fiz todos os questionamentos nas instâncias corretas e, enxergando os limites político-organizativos impostos pela direção do velho PCB, organizei a militância sergipana da juventude para resistir ao burocratismo e oportunismo do Comitê Central e, em níveis distintos, do Comitê Regional, tendo sido expulso do partido e, em tese, da juventude no mês de setembro de 2023.

Aqui, compartilho com toda a militância da UJC e do PCB-RR (que também construo) algumas preocupações sobre as tribunas, a organização da polêmica pública (que a meu ver ultrapassa a questão das tribunas congressuais) e o XVII Congresso Extraordinário.

Desde a cisão e a abertura das Tribunas de Debates, pudemos notar que em todo o país haviam muitos militantes dispostos a pensar, escrever e compartilhar suas reflexões e acúmulos, visando o aprofundamento do processo de Reconstrução Revolucionária e a consolidação do partido entre a classe e as massas. Pela primeira vez em anos, isso está possibilitando a organização e a democratização relativas da polêmica e do debate político-ideológico entre os comunistas.

Considero relativas por três razões:

1 – O Comitê Nacional Provisório definiu que publicaria somente “os textos de caráter político e que tenham como finalidade contribuir para a superação da crise dos comunistas brasileiros”. Em um primeiro momento, esse critério foi o suficiente para que diversas contribuições criativas e positivas surgissem[1]. Contudo, tornou-se com o tempo muito amplo, levando a uma situação em que o debate represado por anos finalmente transborda, mas a decadência político-ideológica acumulada após anos de pecebismo é evidente e muitas contribuições aceitas sequer dialogam com a crise dos comunistas brasileiros, com nossos desafios político-organizativos e com o XVII Congresso Extraordinário, tendendo a ofuscar as tribunas que buscam encarar de frente os problemas e desafios na construção de um partido proletário revolucionário no Brasil;

2 – Nos primeiros meses de 2024 daremos início às etapas regionais do XVII Congresso e ainda são desconhecidas as opiniões e posições dos dirigentes que compõem o CNP sobre a maioria dos temas que discutiremos e/ou apareceram nas Tribunas. Da mesma forma, a CNP, enquanto instância de direção coletiva, não se pronunciou sobre alguns dos temas mais polêmicos abordados nas Tribunas, como os que sugerem a mudança de nome, o abandono de símbolos e a dissolução da UJC[2]. Somado a isso, é praticamente impossível para a maioria da militância acompanhar todas as Tribunas publicadas, e acredito que no momento isso seja verdade tanto para as bases quanto para a direção;

3 – As Tribunas ainda são publicadas de forma arbitrária, anárquica. A direção não sabe ou não consegue (por razões desconhecidas por mim, mas tendo a acreditar que a sobrecarga seja um fator importante) organizá-las de maneira mais consequente e intervir nos debates iniciados nelas, no sentido do convencimento, da formação político-ideológica da militância e da construção, desde já, das condições para a realização de um Congresso qualificado, que garanta a retomada e aprofundamento da Reconstrução Revolucionária e do trabalho político positivo dos comunistas.

Se as coisas continuarem como estão, receio a seguinte possibilidade: que o XVII Congresso Extraordinário não resolva nossos problemas político-organizativos, deixando muitos pontos em aberto e abrindo espaço para minguar a nossa prática política durante e após o conclave.

Não tenho respostas prontas para solucionar esses problemas, mas acredito que precisaremos pensar neles se quisermos organizar a polêmica na imprensa partidária e, mais que isso, organizar a classe trabalhadora no sentido da Revolução Brasileira e do socialismo-comunismo. Se é isso que nossos militantes e dirigentes almejam, e acredito que seja, é preciso pensar e agir, antes que seja tarde...


[1] Como a tribuna “Por um PCB jovem, diverso e contemporâneo” do camarada Golbery Lessa, que foi um dos poucos membros do Comitê Central a encaminhar tribunas para o XVI Congresso do PCB. Além de realizar uma análise qualificada da crise partidária, o camarada apresenta propostas para a solução de alguns dos nossos problemas. Recomendo a leitura na íntegra.

[2] Nesse sentido, faço uma saudação as tribunas dos camaradas Andrey Santiago (“O que o PCB-RR quer da vida?”) e Gabriel Tavares (“Não aceiteis o que é de hábito como coisa natural: uma crítica da autocrítica”), que abordam esses temas polêmicos e fazem críticas necessárias aos erros e omissões do Comitê Nacional Provisório.