'A legalização e descriminalização do aborto deve ser uma pauta prioritária dos comunistas!' (Andressa Bacin)

A opressão patriarcal é inerente ao capitalismo, é também fruto da propriedade privada, portanto, não há maneira de destruir o patriarcado sem destruir o capitalismo.

'A legalização e descriminalização do aborto deve ser uma pauta prioritária dos comunistas!' (Andressa Bacin)
"A carga patriarcal da maternidade e de todos os âmbitos da nossa existência que nos é imposta só será superada com o fim do capitalismo, onde possamos construir uma sociedade verdadeiramente equitativa e conquistemos a libertação da classe trabalhadora como um todo das correntes do capital."

Por Andressa Bacin para a Tribuna de Debates Preparatória do XVII Congresso Extraordinário.

Gostaria de começar essa tribuna fazendo uma definição simples dos significados destas palavras:

Descriminalização: significa que deixou de ser crime, não há punição no âmbito penal.

Legalização: Quando passa a ser permitido e regulamentado por lei.

Aclaração feita, vamos relembrar a citação de Engels em “A origem da família, da propriedade privada e do Estado”:

“O homem apoderou-se também da direção da casa; a mulher viu-se degradada, convertida em servidora, em escrava da luxúria do homem, em simples instrumento de reprodução. Essa baixa condição da mulher, manifestada sobretudo em tempos heróicos e, ainda mais entre os dos tempos clássicos, tem sido gradualmente retocada, dissimulada e, em certos lugares, até revestida de formas de maior suavidade, mas de maneira alguma suprimida.”

Brasil, um país onde suas casas legislativas são constituídas, majoritariamente, por homens cis, heterossexuais, brancos e ricos e que tais legislam para defender os direitos de seus semelhantes.

Legislação essa que trata o aborto com leis de 1940, com 84 anos de defasagem.

Quando a gravidez é decorrente de estupro, risco de morte para a mulher e em caso de feto anencéfalo.

Mas muitas vezes, mesmo as pessoas gestantes que se encaixam nessas possibilidades, encontram grandes dificuldades para terem seu direito garantido.

Mas o que é um abortamento inseguro?

É um procedimento para interromper uma gravidez não desejada, realizado por pessoas que não têm as habilidades necessárias ou em ambientes que não cumprem com mínimos requisitos médicos ou ambas condições.

A OMS estima que se realizem 25 milhões de abortos no mundo por ano, 97% deles em países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos da América Latina, Ásia e África, onde a maioria criminaliza a prática.

Desses 25 milhões se estima 43 mil mortes, totalmente evitáveis.

Complicações por abortamento clandestino são a quinta causa de mortalidade materna no Brasil. São por dia.

Números seguramente subestimados por se tratar de uma prática clandestina.

Vivemos sob uma estrutura machista e patriarcal, o que significa que temos todo um sistema que abrange o senso comum, os costumes, as leis, etc. O que interfere em todas as relações sociais.

É preciso que se tenha noção dessa grande estrutura na qual estamos inseridas para que possamos ver de forma objetiva contra o que estamos lutando.

Qual a realidade brasileira em relação ao assunto?

Usaremos como base dados da Pesquisa nacional do aborto, de 2016 e o relatório do MP do RJ chamado “Entre a morte e a prisão”, que analisou pessoas processadas por abortar, para fazermos essa análise.

Quem são as mulheres presas por abortar no Brasil?

Podemos dividir em dois grandes grupos:

Grupo 1:

Mulheres processadas pela conduta de provocar o aborto em si mesma (art. 124 do CP), com pena de detenção de 1 à 3 anos.

A maioria negras ou pardas com ocupações que evidenciam sua situação de pobreza (prostituta, salgadeira, faxineira, auxiliar de cozinha, manicure etc.).

Residentes em áreas periféricas de suas cidades (favelas na capital ou outras áreas empobrecidas no interior.)

80%, já têm filhos.

Tempo gestacional à época da interrupção superior a três meses.

Grupo 2:

Na sua maioria são mulheres processadas em virtude de investigação policial das clínicas clandestinas de aborto. (Art. 126 do código penal: Provocar aborto com o consentimento da gestante) pena de reclusão de 1 à 4 anos.

Mulheres brancas em 53% dos casos.

Gestação inferior a 12 semanas.

Índice de escolaridade superior ao grupo de mulheres que se submeteu a métodos caseiros de interrupção da gestação.

O grupo de mulheres flagradas em clínicas clandestinas de aborto (chamado pela policia “estouro de clínica”) não experiencia uma situação de pobreza tão drástica quanto as do Grupo 1.

Quem são as mulheres mortas por abortar no Brasil?

Na sua grande maioria mulheres negras, indígenas, pobres, periféricas, faveladas, com baixa escolaridade, que já são mães e submetidas a empregos precários também. São elas as que passam por todo tipo de violência obstétrica, tendo seu direito ao sigilo médico quebrado, são algemadas às macas hospitalares e incriminadas por não terem condições de colocar mais um filho no mundo e acabam morrendo vítimas de complicações causadas por procedimentos medievais.

A brutal desigualdade social brasileira, empurra as mulheres e pessoas com útero para a clandestinidade.

Também se percebe, que quanto menor o grau de instrução dessas mulheres, maior a taxa de mortalidade.

Elas abortam nos fundos de quintais, clínicas baratas, com pessoas desqualificadas, utilizando métodos caseiros como chás abortivos, agulhas de tricô, aros de bicicleta, talo de mamona, etc. No caso das clínicas, elas pioram à medida que diminui o preço cobrado pelo procedimento.

Recebem tratamentos degradantes e torturantes, sofrem todo tipo de dor, mutilações, torturas psicológicas e físicas. O que acaba gerando gravissimas complicações com infecções, hemorragias, perfurações uterinas e abortos incompletos que podem levar à morte.

Quando essas mulheres acabam se vendo obrigadas a procurar o sistema de saúde, sofrem violência obstétrica, que se caracteriza por:

Negativa ou demora no atendimento à mulher em situação de abortamento.

Questionamento à mulher quanto à causa do abortamento (se intencional ou não).

Realização de procedimentos predominantemente invasivos, sem explicação, consentimento, e frequentemente sem anestesia.

Ameaças, acusações e culpabilização da mulher.

Coação com finalidade de confissão e denuncia à polícia da mulher em situação de abortamento.

O ministério da saúde calcula que em 2016 houveram 123.321 internações por complicações de abortamento clandestino. O que gera uma sobrecarga ao sistema de saúde.

As mulheres em situação de vulnerabilidade, dificilmente têm acesso à políticas de planejamento familiar, mesmo que elas sejam oferecidas pelo SUS, seja por desconhecer seus direitos ao acesso à saúde sexual e reprodutiva de forma gratuita, seja por tabus socioculturais e religiosos, seja pela distância desses serviços de seus locais de moradia e outros motivos.

São revitimizadas pelo racismo e sexismo institucionais.

Essas políticas não atingem as mulheres pobres, periféricas de centros urbanos nem as de zonas rurais. A falta de acesso à saúde é um dos grandes agravantes para a morbimortalidade materna por abortos inseguros.

Os serviços de atendimento estão concentrados nos grandes centros e nas capitais, o que impossibilita o acesso de pessoas pobres e do interior. São em torno de 76 serviços vigentes para atender a um país de dimensões continentais como o Brasil. Muitos deles, colocam impeditivos, como solicitar boletim de ocorrência nos casos de violência sexual (o que não é necessario), ou limites de semana muito abaixo do previsto por lei que é de 22, ou atendem em apenas um caso e não nos 3 previstos por lei.

Conversando com muitas mulheres nos bairros que, muitas vezes, são semianalfabetas ou até mesmo analfabetas, elas relatam que têm dificuldade ou são proibidas pelos companheiros de usarem métodos convencionais como a pílula anticoncepcional ou o preservativo ou não têm conhecimento sobre seu direito à outros métodos, como o diu, o chip ou até mesmo a ligadura de trompas, porque esses direitos não são divulgados da maneira que deveriam e a classe trabalhadora não tem acesso a uma educação sexual laica, aberta e livre de estigmas para fazer suas escolhas reprodutivas.

O que dizem as/os ginecologistas brasileiros?

Segundo uma pesquisa da FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) realizada com mais de 10 mil ginecologistas.

Menos de1% dos profissionais gostaria que o aborto fosse proibido em todos os casos.

60 a 80% gostaria que a lei fosse mais aberta.

16 a 18% gostaria que fosse descriminalizado em todos os casos.

Mas parece que esse 1% fala como se fossem todos.

Sabendo que o Brasil é um país de profundas desigualdades sociais, isso se reflete no sistema de saúde. Temos um sistema para as mulheres ricas, que abortam em clínicas privadas com melhores condições, ou viajam para países que legalizaram (já que só é crime em território nacional) e temos um sistema de saúde para pobres.

A ilegalidade só serve para punir as mulheres por ousarem questionar seus lugares pré estabelecidos pelo patriarcado.

Elas sofrem em isolamento e silêncio.

Se viola a autonomia, a integridade física e psíquica, os direitos sexuais e reprodutivos e igualdade de gênero.

Um país que se diz laico em sua constituição, mas que seu Estado burguês exerce estrito controle ideológico na sociedade, principalmente sobre pessoas com útero.

Ainda cede à fé, crenças, opiniões pessoais e tradições que conferem atributos metafísicos ao embrião.

Penalizar o aborto, além de ser um retrocesso dos direitos humanos, envolve questões puramente moralistas, misóginas, patriarcais, raciais e aporofóbicas.

Surgem propostas de lei nefastas com o “Estatuto do nascituro” e o “Bolsa estupro”.

Ou a PEC 181 de 2015 do então senador Aécio Neves que declarava “vida” desde o momento da concepção.

Nunca esquecer do caso da menina de 11 anos de SC, onde vimos como a justiça burguesa e governos fascistas operam para exercer o controle patriarcal sobre mulheres e meninas em situação de vulnerabilidade.

Um dos fatores que corrobora para essa normatização contrária ao acesso à um abortamento legal, seguro e gratuito, são os interesses socioeconômicos de cada país. Sendo assim, enquanto nos países da periferia do capital que se encontram na América do Sul, Ásia e África têm como papel o fator produção de mão de obra para enriquecer o capital, além dos baixos índices educacionais e forte predominância religiosa, imperam as leis proibitivas ao aborto, já os países chamados desenvolvidos, caminham no sentido contrário e têm legislações cada vez menos restritivas, obviamente com muita luta dos movimentos feministas essas leis foram conquistadas.

Sabemos que o Estado se constitui na desigualdade de gênero.

A criminalização também dá lugar à um mercado ilegal de remédios abortivos como o Cytotec (misoprostol), que é vendido à preços exorbitantes, negando o acesso das mulheres pobres à esse método ou, às que podem aceder, muitas vezes não têm o dinheiro suficiente para comprar a dose necessária ou acabam comprando medicamentos falsificados e são levadas a abortos incompletos e complicações que podem ser letais.

Também dá lugar a clínicas clandestinas que chegam a cobrar 5 mil reais por procedimento.

Percebemos que a industria do aborto clandestino é muito rentável.

Um dos argumentos usados pelos contrários a despenalização e legalização, são os gastos que o sistema público de saúde supostamente teria para realizar os procedimentos. Argumento este que não tem fundamento algum, já que os gastos, calculados em 500 milhões de reais nos últimos 10 anos para tratar as complicações dos abortamentos clandestinos, são infinitamente maiores do que o necessário para realizar estes procedimentos dentro da legalidade, em um ambiente seguro e com equipes multidisciplinares para brindar um atendimento digno à essa mulheres.

Até as 12 semanas de gestação se podem usar métodos relativamente simples e rápidos como o misoprostol e a Amiu (aspiração manual intrauterina).

O abortamento sempre existiu, existe e seguirá existindo. A pergunta que deve ser feita é: Quem morre ou é mutilada na clandestinidade?

Criminalizar não faz com que as mulheres não abortem, só colabora para aprofundar a brecha gigantesca entre pobres e ricas.

Passaremos agora a desmistificar algumas questões sobre o abortamento.

A falta de acesso à informação fidedigna, é um instrumento de controle do Estado burguês e das instituições religiosas sobre as pessoas com útero, visto que nós somos quem tem a imposição social de maternar.

Então vamos lá:

Mito 1: “A mulher que aborta entra em depressão”. A chamada “Síndrome pós aborto” não é um diagnóstico psiquiatrico válido. O que pode haver são sentimentos de tristeza e culpa que são fruto justamente da culpabilização social da mulher que aborta.

Quando o procedimento é feito de maneira segura os sentimentos de medo, insegurança e todo o stress causados pelas incertezas trazidas pela ilegalidade, diminuem e o impacto mental do abortamento é menor.

Mito 2: ”A anticoncepção de emergência, a “pílula do dia seguinte”, é um método abortivo”. Isso não é verdade, pois, a função dela é suspender ou interromper a ovulação, portanto não tem nenhum efeito pós fecundação ou no embrião já implantado no endométrio. Sabemos que métodos anticoncepcionais também podem falhar de vez em quando, e quando isso acontece, deveríamos também poder contar com o direito de interromper a gestação não desejada ou não planejada.

Mito 3: “A gestação é mais segura que o aborto”. Na periferia do capitalismo, onde imperam as barreiras sociais, jurídicas e econômicas com imensas dificuldades de acesso à atenção pré natal, cuidados obstétricos ou serviços de abortamento seguros, acabamos sofrendo um sem fim de complicações que seriam evitadas com a garantia de uma saúde pública de qualidade. Quando isso não é assegurado, se recorre à clandestinidade, métodos arcaicos e sem condições de higiene o que gera taxas altíssimas de mortalidade materna.

Mito 4: “ A legalização do aborto não o faz seguro”. Países que legalizaram o abortamento diminuíram suas taxas de mortalidade materna em até 90%. O dado fala por si só.

Mito 5: “Restringir o acesso é a melhor maneira de diminuir o índice de abortos”. Não é verdade! Somente com educação sexual, políticas públicas de saúde sexual e reprodutiva e serviços gratuitos de abortamento é que poderemos prevenir gestações não desejadas e mortalidade materna.

Mito 6: “Aborto com medicamentos é perigoso e pode matar”. O que é perigoso e pode matar é utilizar chás ou ferramentas arcaicas como cabides. O procedimento medicamentoso é o recomendado pela Organização mundial da saúde assim como a aspiração manual intra-uterina.. Não existe isso de retirar o bebê e observá-lo enquanto ele agoniza. Essa é uma mentira perversa!

Mito 7: “As mulheres usariam o aborto como controle de natalidade”. Isso não acontece quando se tem informação confiável e acesso a métodos anticoncepcionais de maneira gratuita. Onde se falha nisso há uma grande quantidade de gestações não desejadas.

Precisamos tirar o aborto dos marcos de pecado e delito. Abortar legalmente não é como esse imaginário coletivo de dor e rios de sangue, isso se dá na clandestinidade.

O Estado e a Igreja não têm direito sobre nossos ventres. O aborto clandestino é uma tragédia social.

A carga patriarcal da maternidade e de todos os âmbitos da nossa existência que nos é imposta só será superada com o fim do capitalismo, onde possamos construir uma sociedade verdadeiramente equitativa e conquistemos a libertação da classe trabalhadora como um todo das correntes do capital.

Mito 8: “Países que legalizaram viram os números de aborto aumentar”. Na Holanda, por exemplo, que é o país com a lei mais aberta, onde se pode abordar de maneira gratuita em qualquer momento pelo motivo que lhe couber à mulher, é o país onde menos abortos há.

Porque juntamente com isso, vêm políticas de redução da violência de gênero, planejamento familiar de qualidade, educação sexual laica, acesso fácil e gratuito a métodos anticoncepcionais, um combo de políticas de saúde sexual e reprodutiva justamente no intuito de diminuir o número de abortos.

Mito 9: “Gestar e criar é uma obrigação divina ou inclinação nata de gênero”. Não somos incubadoras à serviço do capital, temos direito pleno de decisão sobre como, quando e se queremos maternar.

É mentira que não temos opção, que sermos mães é o único caminho possível de realização plena, e que mulheres que não desejam maternar, ou que, em determinado momento, não podem e decidem abortar, são más, egoístas, promíscuas, que receberão castigos divinos, etc.

Um dos trechos do relatório “Entre a morte e a prisão” diz o seguinte:

“Em um dos casos analisados pela Defensoria Pública, o procedimento era realizado por duas mulheres (mãe e filha) que não possuíam formação médica. Narra a denúncia oferecida pelo Ministério Público que ambas realizaram três procedimentos abortivos. No primeiro, introduziram um tubo de borracha flexível no útero da vítima e injetaram uma substância indeterminada. Diante do fracasso, introduziram uma agulha de tricô, o que deu ensejo não só à quebra desse objeto no interior do corpo da vítima, mas à perfuração do seu útero e da parede do intestino. Após fazer a vítima pernoitar no local, sem qualquer prestação de socorro médico adequado, a vítima, na manhã seguinte, expeliu o feto, apresentando intenso sangramento e febre. Diante disso, iniciou-se o terceiro procedimento abortivo: a aspiração, provavelmente para retirar qualquer resíduo existente no útero, o que fez com que parte das vísceras da vítima fosse expelida pelo canal vaginal. Somente após a constatação notória de que ela se encontrava morrendo, as acusadas procuraram socorro junto a uma terceira pessoa, também denunciada, que deixou a vítima no hospital”.

Dia 28 de setembro:

Essa data é implementada no quinto congresso feminista latinoamericano e caribenho de luta pela descriminalização do aborto que aconteceu em 1990. Esse congresso aconteceu na Argentina, que é uma país que tem uma luta histórica pelo direito ao abortamento legal, que vem se dando desde seu processo de redemocratização nos anos 80. Agora ameaçada pelo governo de extrema direita de Javier Milei.

No Brasil, essa data também é marcante porque no dia 28 de setembro de 1871, tivemos a “lei do ventre livre”, onde o Estado passou, teoricamente, a considerar livres filhos de pessoas escravizadas nascidos a partir daquele momento. Por isso que o dia 28 é tão simbólico nessa luta.

Silvia Federici, em “O calibã e a bruxa”, trás que, já na idade média a igreja punia com 10 anos de castigos por heresia as mulheres que abortavam, então não é nenhuma novidade nem o abortamento nem o controle da igreja sobre as mulheres.

Algumas exemplos latinos de luta:

Aqui temos que fazer a análise de que são países profundamente religiosos, marcados pelo colonialismo, pelo racismo e pelo patriarcado com profundas desigualdades de classe mas que chegaram à conclusão de que criminalizar não funciona.

Colombia: em fevereiro de 2022, apenas descriminalizou até as 24 semanas mas, legalizadas, permanecem só as causais que já eram permitidas desde 2006, que são: estupro ou incesto, risco de morte para a mãe ou malformação genética grave do feto.

México: Em 2023 o juízes da Suprema Corte despenalizarão o aborto à nivel federal. Antes era decisão de cada estado.

Argentina: Depois de apresentado 8 vezes, sob o lema “Educação sexual para decidir, anticoncepcionais para não abortar e aborto legal para não morrer”, a prática foi despenalizada e legalizada em todo o país até as 12 semanas de gestação.

Após décadas de luta massiva dos movimentos feministas e de muita pressão ao governo de Alberto Fernández, que havia prometido em campanha para a presidência, se aprova a lei.

A importância de campanhas como a “Campanha nacional por el derecho al aborto legal, seguro e gratuíto”, “Ni una menos” e o anual “Encuentro nacional de mujeres” foram cruciais para a conquista desses direito pelas hermanas.

Apesar disso, que seja aprovada uma lei não significa que ela seja aplicada de maneira uniforme, em províncias pobres da Argentina, principalmente do norte, que são profundamente católicas como Jujuy, Salta e Tucumán, há uma imensa dificuldade de que a lei seja implementada.

Há cada 3 horas uma criança é forçada a parir na Argentina, segundo os últimos dados da UNICEF e a maioria dos casos de abuso intrafamiliar se dá justamente nessas províncias mais conservadoras. Assim como se negam a aplicar a lei de educação sexual integral que teoricamente é obrigatória nas escolas de toda a Argentina desde 2006.

Um exemplo emblemático de retrocesso é El Salvador, que restringe o direito ao aborto em todos os casos, pois, constitucionalmente, considera a vida desde o momento da concepção. Nesse país, mulheres são condenadas a até 30 anos de prisão, inclusive quando terminam no sistema de saúde por abortos espontâneos. El Salvador tem um índice altíssimo de abortamento clandestino e de suicídio de pessoas gestantes.

A mulher ou pessoa com útero que aborta, tem que lidar com a culpa, a vergonha, a dor, física e emocional. Então, abortar, não é algo que nenhuma pessoa deseje, é, quando feito em condições indignas, gera um amontoado de inseguranças e medos.

Muitas vezes ouvimos “Ah, é só dar para adoção!”, mas daí quando fazemos isso, também somos condenadas, como a gente viu com o caso da atriz Klara Castanho que foi exposta pela mídia e foi extremamente criticada por dar o bebê em adoção.

Então, a conclusão a que se chega é que nada do que a mulher fizer, no sentido de decidir o rumo da sua própria vida vai agradar, porque vai estar questionando o nosso lugar pré estabelecido pela sociedade dos homens brancos. O que a gente tem que entender é o seguinte:

1. O Brasil não é evangélico, não é católico, não é espírita. O Brasil é um Estado laico portanto, os direitos humanos não podem reger-se pelo que quer o pastor, pelo que quer o padre. Aborto legal, seguro e gratuito é uma questão de segurança social e saúde pública. Nenhuma igreja deve impor sua moralidade para toda a população.

2. A gente precisa parar de demonizar o feminismo, a luta das mulheres não é contra os homens e sim contra a ordem social patriarcal estabelecida pelo capitalismo. Nossas lutas são legítimas e são as lutas de toda a classe trabalhadora.

3. Quero frisar a importância e a urgência da nossa organização enquanto classe trabalhadora. Te organiza no teu bairro, na associação de moradores, no teu local de estudo, de trabalho, no sindicato da tua categoria, num coletivo, num partido que defenda os nossos interesses.

Só com organização popular a gente vai derrubar o capital e libertar a classe trabalhadora dessa exploração insana.

O abortamento clandestino é uma questão tão material que, no momento em que esse texto está sendo escrito, mulheres estão morrendo ou sendo presas por abortar em várias partes do mundo, inclusive no Brasil. Tão material mas ao mesmo tempo tão erroneamente tida como subjetiva e consequentemente secundarizada.

Há um sucateamento proposital das políticas públicas de saúde, já desde muito antes do governo Bolsonaro, e que se agravou imensamente na pandemia de COVID-19..

Para concluir, devemos deixar muito claras algumas coisa:

O nascituro não pode ser entendido como uma pessoa titular de direitos da mesma forma que os que já nasceram.

As mulheres não podem ser submetidas à maternidade compulsória imposta pelo capitalismo. Temos autonomia sobre nossos corpos, e mais do que isso, temos direito à uma vida plena e saudável.

Não podemos ficar à mercê da bancada da bíblia.

Uma mulher não é um útero à serviço da sociedade.

Precisamos tirar o manto de vergonha e hipocrisia que cobre o tema do aborto na sociedade brasileira.

Despenalizar e legalizar o aborto em todas as situações.

Investir em educação sexual integral, massiva e laica.

Investir em programas de planejamento familiar de qualidade e que abarque todo o território nacional.

A opressão patriarcal é inerente ao capitalismo, é também fruto da propriedade privada, portanto, não há maneira de destruir o patriarcado sem destruir o capitalismo. Como nos disse Angela Davis “Se trata de transformar as estruturas sociais”.

Não podemos cometer o erro de secundarizar a pauta como era feito no PCB CC.

Por aborto legal, seguro e graruito já!