A hegemonia proletária na luta antiimperialista

Apenas a política proletária dos comunistas representa uma alternativa científica e consequente para a luta contra imperialismo e pela soberania nacional, pois apenas a revolução proletária, socialista, pode romper definitivamente as amarras que submetem nossa nação aos interesses do capital.

A hegemonia proletária na luta antiimperialista
Reprodução/Foto: Ricardo Stuckert.

Por Machado | Tribuna de Debates

Os mais recentes acontecimentos na conjuntura nacional e internacional vem confirmando com precisão a constatação de nosso Partido de que o atual momento de crise capitalista vem conduzindo ao acirramento das contradições entre as potências imperialistas e ao desenvolvimento de uma terceira guerra mundial interimperialista.

Nos últimos meses, diversos acontecimentos na arena internacional são consequência e expressão desse acirramento, colocando a olhos nus o avanço da barbárie imperialista:

● a derrubada do governo sírio e instauração de um governo fantoche do imperialismo dos EUA e de Israel;
● a intensificação do genocídio em Gaza, com apoio e cumplicidade de todas as potências imperialistas;
● a regionalização do conflito no oriente médio, com a ofensiva de Israel e EUA contra o Irã;
● O reforço, por Trump, dos embargos sobre Cuba;
● O fechamento do regime venezuelano e a propaganda da proposta militarista do governo Maduro para avançar sobre o território do Essequibo;
● A continuidade do conflito interimperialista na Ucrânia, com uma ofensiva sem precedentes do exército russo e o reforço do autoritarismo do governo ucraniano, já alvo de protestos.

E, mais recentemente, apesar da ilusão de que a suposta “neutralidade” brasileira e uma diplomacia “multipolar” poderiam proteger nosso país das pressões imperialistas, Donald Trump escancarou um ultimato contra nossa soberania nacional ao elevar tarifas sobre os produtos brasileiros pressionando pela anistia para a extrema-direita golpista, em particular para Bolsonaro.

Esse ataque, claro, não é fruto do “delírio” de um “líder insano” como a mídia liberal quer fazer acreditar, mas um claro gesto de pressão para afastar o Brasil da aliança subimperialista dos BRICS e submetê-lo à hegemonia do bloco EUA-UE-OTAN, seja pela submissão do atual governo social-liberal, seja pela eleição de um governo de extrema-direita ideologicamente disposta à afastar o Brasil dos BRICS.

Frente ao ataque imperialista, as massas brasileiras responderam com indignação, repudiando a postura dos Bolsonaro, que conspiraram contra seu próprio país, e demonstrando que, mesmo após décadas de dormência, ainda há consciência, mesmo que inicial, da defesa da soberania de nosso país.

Porém, não apenas o proletariado e as camadas oprimidas da pequena-burguesia se levantaram contra o imperialismo, mas mesmo algumas frações da burguesia brasileira já se pronunciaram contra esse ataque, que também impacta em seus próprios interesses de classe, e o próprio governo federal já adotou palavras de ordem nacionalistas e vem buscando se apresentar como fiador da soberania nacional, sob a narrativa de um suposto giro à esquerda.

Em todos os países subordinados e intermediários na cadeia imperialista, em um momento ou outro, situações similares vão seguir acontecendo e sem dúvidas as burguesias “nacionais” vão pressionar os Partidos Comunistas e o proletariado a subordinar sua política e se subordinar à unidade nacional.

Porém, num país de capitalismo desenvolvido, mesmo que dependente, como o nosso, não é possível conciliar os interesses do proletariado com os da burguesia. Apesar das bravatas e da tentativa das lideranças burguesas e pequeno-burguesas de submeter os trabalhadores à política de “unidade nacional” com a burguesia e seu governo contra o imperialismo, o dever do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário é demonstrar com clareza os limites dessa frente e defender rigorosamente a independência completa do proletariado frente às demais classes.

Na presente conjuntura, haverá duas tendências de luta contra a agressão imperialista, uma burguesa e uma proletária, contraditórias entre si. Se às vezes alguns golpes poderão ser dados em conjunto, a luta antiimperialista só será efetiva e consequente se estiver fundada no antiimperialismo proletário, consciente e independente, denunciando qualquer tentativa de submetê-la ao “antiimperialismo burguês”.

Afinal, apenas a política proletária dos comunistas representa uma alternativa científica e consequente para a luta contra imperialismo e pela soberania nacional, pois apenas a revolução proletária, socialista, pode romper definitivamente as amarras que submetem nossa nação aos interesses do capital monopolista, nacional e estrangeiro.

O “antiimperialismo burguês” na luta pela soberania nacional

Na última sexta, 25/07, o Salão Nobre da Faculdade de Direito da USP, celeiro por excelência dos quadros da burguesia paulista, abrigou um ato pelo lançamento de uma “Carta em defesa da Soberania Nacional”, com a palavra de ordem “somos 100% Brasil. Viva soberania”. Esta carta foi escrita por juristas e assinada por inúmeras organizações e entidades, tanto burguesas (inclusive um instituto sionista), pequeno-burguesas, e até centrais e sindicatos pelegos (Força SIndical, UGT) e social-liberais (CUT, CTB), a União Nacional dos Estudantes e algumas organizações populares, incluindo a governista Frente Brasil Popular.

Vejamos o que diz a carta dos juristas e como procedeu a compor esse notável amálgama de interesses e classes sociais:

“A soberania é o poder que um povo tem sobre si mesmo. Há mais de dois séculos, o Brasil se tornou uma nação independente. Neste período, temos lutado para governar nosso próprio destino. Como nação, expressamos a nossa soberania democraticamente e em conformidade com nossa Constituição.”

Um “curioso” início. Afirmar que há dois séculos o povo brasileiro tem poder sobre si mesmo, pela independência, ignora o “detalhe” de que havia um imperador português exercendo o poder e que a ampla maioria desse povo estava literalmente escravizada. Mesmo no século XX, esqueceram que em 1964 os EUA e a burguesia implementaram uma sanguinária ditadura militar, e somente após 1988 os trabalhadores analfabetos (que constituíam a maioria da população) conquistaram o direito à voto. Mesmo a vigente Constituição de 1988 foi estabelecida ainda sob tutela militar. Interessante “poder” que o povo teve sobre si mesmo no Brasil. Outra interessante afirmação surge pouco depois:

“Nossa Constituição garante aos acusados o direito à ampla defesa. Os processos são julgados com base em provas e as decisões são necessariamente motivadas e públicas.”

Mais uma afirmação particularmente “curiosa” em um país em que há mais de 182 mil pessoas presas sem julgamento e com uma população encarcerada de mais de 600 mil trabalhadoras, em sua maioria negros!

Ora, uma coisa é confirmar a justeza do julgamento de Bolsonaro por tentar um golpe de estado, fato que é de amplo conhecimento público e possui incontáveis evidências. Mas existe um tom muito diferente em defender a “integridade” do judiciário brasileiro, que não é controlado pelo povo e reiteradamente ataca os direitos duramente conquistados pela classe trabalhadora e submete milhares de trabalhadores ao cárcere sem quaisquer evidências (ou mesmo julgamento), e foi também peça central para o golpe de 2016 e a prisão de Lula em 2018, sob ordens do Departamento de Estado dos EUA e de diversas frações da burguesia brasileira.

Nessa situação, é reconhecível que Bolsonaro não é perseguido, mas privilegiado pelo sistema judiciário brasileiro: enquanto um trabalhador negro acusado de tráfico pode passar anos preso sem julgamento, independente de quaisquer evidências, um ex-presidente responsável por um genocídio e pela tentativa de golpe de estado esteve livre por anos e apenas agora está restrito à uma tornozeleira eletrônica, apesar da notoriedade pública destes fatos.

Não precisamos nos deter em cada minúcia incorreta na formulação da carta para demonstrar seu caráter, porque é evidente que nela qualquer posição em defesa do poder do povo brasileiro sobre si mesmo mas, ao contrário, uma defesa cristalina das instituições burguesas, e particularmente do poder judiciário brasileiro. A carta sequer omite isso:

“Neste grave momento, em que a soberania nacional é atacada de maneira vil e indecorosa, a sociedade civil se mobiliza, mais uma vez, na defesa da cidadania, da integridade das instituições e dos interesses sociais e econômicos de todos os brasileiros.”

Claro, a carta “omite” questões não pouco importantes para a soberania nacional: a privatização de empresas estratégicas como Vale e Embraer, a preço de banana, e as concessões de áreas estratégicas da nossa economia para agentes internacionais como a ENEL, que sustenta sua taxa de lucro internacional com a exploração do povo brasileiro, a entrega da Base de Alcântara no Maranhão aos EUA mesmo com evidências de que tenham sabotado o programa espacial brasileiro, ou a manutenção na Petrobrás da política de preço de paridade de importação, que encarece a gasolina brasileira e sustenta portentosas distribuições de lucros aos investidores estrangeiros.

Não é em defender o Brasil que estão interessados os nobres juristas, mas em defender a soberania da burguesia brasileira: seu direito de manter suas “instituições” sem a ingerência de outras burguesias, seu direito de legislar como os trabalhadores serão explorados por todas as burguesias, seu direito de vender “soberanamente” o patrimônio do estado brasileiro sem interferências estrangeiras e em melhores condições de concorrência.

Ora, os juristas da USP repetiram a ação de 2022, quando também organizaram um manifesto da burguesia “democrática” em defesa do Estado Democrático de Direito (na realidade, da democracia burguesa), arrastando boa parte das organizações populares à reboque da política “democrática” da burguesia (inclusive, à época, o PCB, pela ação da fração dirigente que já havia abandonado o marxismo-leninismo e atropelava as decisões do XVI Congresso). E, para reforçar a intenção de submeter o proletariado à sua direção, a nova carta da burguesia termina com uma “proposta”:

“Quando a nação é atacada, devemos deixar nossas eventuais diferenças políticas, para defender nosso maior patrimônio.”

Não apenas a burguesia busca com essa carta formar uma frente burguesa pela soberania, que poderia golpear em conjunto com o proletariado. O que a “Carta” reivindica é uma política de “união nacional” para defender os interesses da burguesia, uma política que só pode ser, na prática, de submissão dos trabalhadores à direção política da burguesia e ao falso “antiimperialismo” burguês.

Frente aos diferentes interesses da burguesia e do proletariado, a burguesia propõe que o proletariado abandone suas pautas (soberania consequente) para defender a “soberania” do poder judiciário, da grande burguesia, dos latifundiários… Propõe que não se mobilize com independência, mas componha uma ampla frente pautada pelo “mínimo denominador comum”: a democracia burguesa e suas instituições.

Ao colocar o proletariado à seu reboque, esta fração burguesa busca não apenas garantir uma “base de massa” (mesmo que limitada) para defender seus interesses particulares, como também coibir e limitar as massas indignadas para que não reivindiquem mudanças, mesmo que mínimas, na estrutura dependente do capitalismo brasileiro, como a atualização da lei de remessas estrangeiras dilapidada por Bolsonaro, a tributação de remessas ao exterior, ou limites à ação dos monopólios estrangeiros, em especial as Big Techs (Meta, Google, Microsoft).

A hipocrisia dos social-liberais

Apesar de utilizar uma retórica distinta, também o social-liberalismo e, em especial, o governo Lula-Alckmin que dirigem, segue a mesma tendência burguesa para defender a soberania.

No último mês, diversos pronunciamentos e discursos do presidente Lula tocaram no tema com uma fraseologia incisiva, ao que rapidamente os setores governistas e “independentes” da esquerda passaram a comemorar como a consolidação de um tão esperado “giro à esquerda” do governo federal, e já adotam as palavras de ordem de “unidade nacional”.

E, claro, mais uma vez começam a pressionar as organizações consequentes do proletariado, que realizam a oposição ao governo Lula, para abaixar suas bandeiras e apoiar o governo burguês de Lula, agora não somente por conta do fascismo como também por conta da agressão imperialista.

Porém, no que de fato consiste o “giro” de Lula, para além da retórica? Ao adotar a palavra de ordem “o brasil é dos brasileiros” e proclamar frases como “nos nossos recursos ninguém põe a mão”, o governo federal não toma medida alguma para combater o imperialismo. Pelo contrário, já começa a negociar as tarifas com os EUA e realizar mediações para aliviar a pressão sobre a burguesia nacional. Enquanto Lula proclama discursos, manda Alckmin conciliar com os EUA e a burguesia.

O governo social-liberal não defende nossa soberania, mas busca vendê-la em condições um pouco mais vantajosas para certas frações da burguesia. O mesmo governo levantando a “unidade nacional em defesa da soberania”:

●  Está negociando a exploração do petróleo na foz do Amazonas com empresas imperialistas;
● Mantém o PPI da Petrobrás, distribuindo dezenas de bilhões em lucros do petróleo brasileiro para investidores estrangeiros;
● Mantém a privatização da Eletrobrás;
● Regulamenta a concessão de florestas e prisões para a iniciativa privada;
● Desenvolveu o Arcabouço Fiscal e faz uma ampla política de austeridade que sufoca o investimento público brasileiro;
● Manteve a política nacional de desestatização em que o BNDES financia a privatização de empresas públicas;
● Distribui o maior plano safra para garantir os lucros exorbitantes do agronegócio exportador que sustenta a posição dependente do capitalismo brasileiro;
● Negocia com a China um “corredor do agronegócio”, rasgando terras indígenas para melhor exportar os recursos brasileiros;
● Ameaçou um corte bilionário nos recursos das universidades federais, que acabaria de esmigalhar a pouca produção soberana de conhecimento e tecnologia;
● Mantém relações comerciais com Israel, financiando e abastecendo o genocídio, chegando a deportar uma família palestina; etc.

É este governo que os social-liberais (abertos e envergonhados) querem convencer os trabalhadores que luta agora pela “soberania nacional” e contra o imperialismo.

É visível a hipocrisia do social-liberalismo que, há anos, vem pregando a “unidade nacional” sob direção da burguesia, e agora mantém a mesma política, apenas “ajustando” o discurso às novas condições e visando recuperar parte da popularidade para as eleições de 2026, e ainda afirma haver um “giro”. Deve ser um “giro de 360 graus”, pois mesmo nessa situação de ameaça, não há qualquer disposição em balançar a correlação de forças ou alterar mesmo que uma pequena parcela das amarras que submetem nosso país ao sistema imperialista internacional.

Pelo contrário, mesmo no discurso dos comunicadores governistas, ressalta-se com frequência a exaltação aos monopólios brasileiros e inclusive à grandes empresas estatais que foram privatizadas a preço de banana, com apoio do BNDES, e extraem brutalmente os recursos naturais do povo brasileiro, colocando os lucros acima da vida, como a Vale.

É claro que as posições de classe dos social-liberais, a composição de sua base social e alguns outros fatores lhes diferenciam em parte da burguesia democrática. Em alguns casos e discursos, pronunciam-se também pela redução das desigualdades sociais, da soberania popular, e até, às vezes (quando o ambiente é “favorável”), citam medidas progressistas e criticam certas privatizações (sem, claro, tensionar em demasiado a burguesia). Algumas organizações populares são inclusive bastante consequentes em suas atitudes e tomam medidas combativas em certa medida. Porém, não somos daqueles que admiram a beleza de uma árvore enquanto a floresta queima. Qualquer analista honesto e consequente, ao olhar o “conjunto da obra”, a tônica geral da política realizada agora e nos últimos anos, só poderá diagnosticar a humilhante submissão à política burguesa que impregna o social-liberalismo.

Os ideólogos do social-liberalismo passaram os últimos anos denunciando (corretamente) o papel do judiciário brasileiro (com apoio do imperialismo) na ofensiva burguesa iniciada em 2015, com o golpe parlamentar contra o governo Dilma (conduzido por Miguel Reale Jr., autor da “Carta aos Brasileiros pelo Estado Democrático” de 2022) e a prisão ilegal de Lula, às vésperas da eleição (época em que o “democrático” TSE deu ordem judicial para impedir a publicação de entrevista de Lula durante as eleições), conduzindo à vitória de Bolsonaro.

Mas, agora, por conveniência conjuntural, aderiram à direção da burguesia nacional para a defesa dessa mesma instituição, e proclama aos quatro ventos o caráter idôneo e a defesa irrestrita das instituições da democracia burguesa. Os erros na política são, claro, inevitáveis. Porém, persistir indefinidamente no erro não é apenas burrice, como, nesse caso, sintoma expresso da equivocada estratégia seguida pelas organizações que aderem à essa política subserviente.

O pano de fundo destes desvios e vacilações é a reformulação, pelas organizações social-liberais, da estratégia “democrático-nacional” que lega ao proletariado o papel de “apoio” à burguesia nacional até que ela leve até o fim um desenvolvimento democrático e autônomo do capitalismo. É esse mesmo desvio subserviente que encontra agora sua expressão no apoio ao governo burguês de Lula-Alckmin, na “unidade nacional”, na “defesa das instituições”.

Desde 2005, no XIII Congresso do PCB, os comunistas brasileiros romperam com essa estratégia subserviente e destacam o papel hegemônico do proletariado na construção da revolução socialista, tarefa imediata e inadiável, tal como outras organizações próximas. Porém, a cada passo da conjuntura, “novos” acontecimentos desviam diversas organizações e quadros e reafirmam a ilusão na possibilidade de um desenvolvimento autônomo do capitalismo sob a condução da burguesia nacional. Por isso, é nosso dever reforçar com ainda mais ênfase a independência de classe do proletariado e criticar sem vacilação cada um desses desvios que submetem os trabalhadores à política liberal da burguesia.

A posição comunista

Constatar a existência desta tendência burguesa na luta antiimperialista significaria que os comunistas deveriam se afastar dela, mantendo “puras” suas atividades? Negamos veementemente essa visão limitada.

Os comunistas são os mais resolutos defensores da soberania nacional, porque apenas a revolução proletária e o socialismo dão uma resposta definitiva para libertar o Brasil das amarras do imperialismo, desenvolver as forças produtivas brasileiras e garantir a soberania da ampla maioria da população, dos trabalhadores, sobre o destino de suas vidas.

Defender a soberania nacional é, também, parcela indissociável da construção da revolução socialista e a elevação a nível nacional da consciência dos trabalhadores brasileiros na luta contra o imperialismo para construir o socialismo em nosso país que, quando estiver sob controle dos trabalhadores, certamente sofrerá um número infinitamente maior de agressões do que agora, e precisará de uma classe educada na defesa da soberania nacional para defender sua revolução. Para os marxistas-leninistas consequentes, a defesa da soberania nacional é indissociável da construção do socialismo.

Mas, justamente por isso, a defesa da soberania nacional não pode jamais estar associada à defesa do atual sistema político e econômico, que é justamente o ponto de apoio do imperialismo para manter sua dominação. O capitalismo e a democracia burguesa não oferecem qualquer alternativa autônoma ou independente de desenvolvimento das forças produtivas, e muito menos desenvolve-se sem rupturas ao socialismo.

O capitalismo brasileiro é o elo de dependência que submete nossa nação não apenas à dominação estrangeira, mas a participar como elo intermediário também na dominação de outras nações, seja economicamente, como também militarmente – como o primeiro governo Lula desnudou ao lançar o Brasil como líder militar da vergonhosa intervenção imperialista no Haiti (MINUSTAH).

E, justamente por isso, os comunistas não devem se furtar da luta antiimperialista, mas lutar decididamente para estabelecer a liderança e direção dessa luta e demonstrar às camadas oprimidas pelo imperialismo que somente a alternativa socialista as libertará dessa opressão. Mas isso só pode ser feito na medida em que o proletariado apresentar suas bandeiras independentes na luta, na medida em que consolidar sua própria força, como ensinou Lênin:

“As grandes questões da liberdade política e da luta de classes são resolvidas em última análise unicamente pela força e nós devemos preocupar-nos com a organização e preparação desta força e com o seu emprego activo, não somente defensivo mas também ofensivo.” (Duas táticas da social-democracia na revolução democrática. Lênin, Obras Escolhidas, v. 1, p. 392)

Em mais esse embate contra o imperialismo, em que desnuda-se a contradição e a opressão que fundamenta a ordem capitalista, especialmente em seu estágio imperialista, somente os comunistas podem ser o baluarte da organização e preparação da força independente da classe proletária e de sua hegemonia sobre as demais camadas oprimidas, e somente essa força independente, somente a hegemonia proletária, poderá oferecer uma alternativa vitoriosa na luta antiimperialista.

Assim, a posição do PCBR está mais que correta ao elencar não apenas a luta contra esta agressão imperialista, mas também levantar bandeiras mais avançadas que demonstram claramente os principais fundamentos da opressão imperialista e as principais demandas parciais necessárias para combatê-la, as quais caminham resolutamente no sentido da revolução socialista.

Nesse sentido, ligamos diretamente esta agressão imperialista aos seus “agentes internos” da extrema-direita brasileira, e demonstramos que a política de lentidão e conciliação do governo  da burguesia levaram a isso, defendemos a prisão e confisco de todos os bens dos golpistas e lesa-pátrias, o que não é sequer uma medida demasiado radical, já que os EUA já tomaram medidas como o bloqueio de bens contra Alexandre de Moraes como forma de pressão, e permite tocar nos patrocinadores do fascismo.

Mas, não deixamos intocados os aspectos econômicos da dependência, e por isso levantamos também importantes demandas parciais necessárias para enfraquecer a agressão imperialista e sustentar a soberania nacional brasileira, como a reestatização e nacionalização de setores estratégicos da economia nacional. E, ainda, para garantir a soberania de nossa economia, é importante acabar com o Arcabouço Fiscal de Haddad, que impede investimentos necessários e, pior, ameaça os gastos com saúde e educação, dizimando setores importantes na garantia da autonomia industrial e científica do país.

E também colocamos no centro a soberania também sobre a operação das Big Techs, instrumentos do imperialismo com agendas alinhadas à intervenção e capacidade de influenciar milhões de brasileiros ainda pouco conscientes e manipulá-los com preconceitos e mentiras, formando um pilar ideológico importante da dominação imperialista.

Citamos ainda outras medidas importantes, como limitação e tributação das remessas de lucros ao exterior, fim do programa nacional de desestatização apoiado pelo BNDES, fim dos subsídios ao agronegócio, desenvolvimento do programa nuclear brasileiro.

O PCBR faz uma ampla campanha internacionalista em solidariedade ao povo palestino e defende a ruptura das relações de Brasil com Israel, o que enfraqueceria o estado sionista que é o baluarte da guerra e da opressão no oriente médio, enfraquecendo também o bloco EUA-UE-OTAN.

E, por fim, para garantir a verdadeira soberania e independência do poder judiciário, defendemos que ele deve estar submetido democraticamente ao povo brasileiro, através da eleição e de mandatos revogáveis para todos os juízes, garantindo ao povo a possibilidade de repelir democraticamente qualquer intervenção estrangeira ou abuso do poder judiciário.

As medidas parciais defendidas pelo PCBR (e que não se limitam apenas a estas) estabelecem medidas reais para a soberania nacional do Brasil, e são estas bandeiras que o proletariado revolucionário deve levantar, esquivando-se das falsas soluções e da política rebaixada da burguesia, que fala de soberania mas defende apenas os próprios privilégios.

A unidade nacional

Levantar essas medidas não afastará a burguesia nacional de uma frente contra o imperialismo? Este é, claro, o fundo da questão. As tendências social-liberais são da opinião de que levantar demandas independentes afastará a burguesia da luta e, portanto, para “ampliar o leque de alianças” e desenvolver a “frente ampla” (contra o fascismo ou o imperialismo, dependendo do momento), é necessário rebaixar as demandas ao mínimo denominador comum: ou seja, às demandas da burguesia democrática.

Mas um marxista-leninista vê a questão sob outra ótica:

“E tanto a «simpatia da sociedade» como a melhoria da vida são resultado de um elevado desenvolvimento da luta. Se os liberais (e os liquidacionistas) dizem aos operários: vocês são fortes quando a «sociedade» simpatiza convosco, o marxista diz aos operários uma coisa diferente: a «sociedade» simpatiza convosco quando sois fortes” (Lênin, Greve econômica e greve política)

A burguesia democrática está presente na luta pelos seus próprios termos e interesses, e aponta seus próprios interesses em suas pautas, buscando limitar a luta à seus objetivos particulares. Certamente, o proletariado não deixará de lutar contra o inimigo comum por isso. Mas abandonar a própria força, deixar de lado seus próprios interesses, seria dar a vitória de imediato ao inimigo, porque a burguesia não tem condições e nem interesse de levar qualquer luta similar até o fim, pela sua própria posição objetiva na estrutura da produção social, que se às vezes coloca os interesses de algumas frações em contradição (ou melhor, concorrência) com o imperialismo, ainda mantém mesmo estes setores amarrados ao sistema, aos monopólios.

E, especialmente num país de capitalismo dependente como o Brasil, essa mesma burguesia, para combater o imperialismo mesmo que “um pouco”, teria que avançar para além dos limites do capitalismo, o que esta jamais faria. Pelo contrário, apenas o proletariado, como força independente, pode implementar à força mesmo que às medidas mais simples elencadas acima e que poderiam reforçar, mesmo parcialmente,  nossa soberania.

E justamente por isso, nas lutas comuns com a pequena-burguesia e mesmo as poucas “frações democráticas” da burguesia, o proletariado deve aplicar os golpes em conjunto sem jamais unir-se sob uma bandeira alheia, sem jamais e nem por um minuto deixar de construir sua própria organização e força independente.

Ora, mesmo se consideramos que a burguesia poderia afastar-se de determinado combate em razão das demandas propostas pelo proletariado, isso só ocorreria em condições onde o proletariado possui uma força independente considerável e, nesses casos, a parca força das frações burguesas que concorrem com um ou outro aspecto do sistema seria desprezível e desnecessária para a luta, e muito mais vantajosa seria reforçar a posição independente do proletariado consequente, mesmo que às custas de perder o “aliado” mais vacilante.

Em qualquer caso, portanto, o dever dos comunistas é o mesmo: fazer avançar a consciência, força e organização independentes do proletariado.

E, para isso, diversas manobras táticas podem ser realizadas, e até aproximações e concessões com setores em lutas particulares, mas jamais deve ser abandonado o fundamento estratégico desse trabalho: os interesses particulares e objetivos do proletariado, ou seja, suas bandeiras revolucionárias. Somente assim, sem submeter os trabalhadores à burguesia em momento algum, devem os comunistas se envolver em todas as lutas cotidianas e conjunturais e, através delas, trabalhar para elevar a consciência proletária e reforçar sua hegemonia sobre as demais camadas oprimidas.

E, por isso, nosso Partido acreditou necessário participar dos atos convocados em defesa da Soberania Nacional para o dia 1º de Agosto, por iniciativa das organizações governistas e social-liberais que hoje hegemonizam a esquerda, tendo em vista que seus motes e espaço permitem uma atividade independente do proletariado e uma intervenção unitária e ativa dos trabalhadores contra o imperialismo, elevando a consciência e unidade da classe, mesmo que nesse espaço participem também forças vacilantes, governistas, etc.

Por outro lado, rejeitamos enfaticamente a participação em atos convocados pela burguesia pela aprovação de seu programa em defesa das “instituições” burguesas, como foi o “ato” de 25/07 em São Paulo e outros similares (como um convocado pelos juristas da Universidade Federal de Goiás para 30/07), atos limitados à defesa do sistema capitalista e aos interesses da burguesia, por mais variada a participação de organizações populares em sua construção.

É nessa atividade cotidiana, de agitação, propaganda e intervenção nas lutas unitárias, que devemos demarcar a corrente proletária do antiimperialismo, separando-a da tendência burguesa e governista, e quanto mais claramente pudermos fazê-lo, mais seremos capazes de desenvolver a hegemonia proletária em cada um destes combates.

Hegemonia proletária e internacionalismo

E esse, acredito, deve ser sempre o papel dos comunistas em cada canto do mundo, e, por isso, não devemos hesitar em apoiar e desenvolver nossos laços de solidariedade internacionalista com os PCs que, mesmo nos momentos em que a conjuntura impõe combater lado a lado com a burguesia, não abandonam a independência de classe do proletariado, levantam as bandeiras proletárias e utilizam cada um desses momentos de combate não para ensinar a “unidade” aos trabalhadores, mas para elevar sua própria consciência e organização, e em criticar fraternalmente aqueles que, por diversas razões, ainda que momentâneas, subordinem suas pautas às da burguesia ou da pequena-burguesia.

Sobre isso, gostaria ainda de comentar um importante caso particular.

No Irã, durante a ofensiva estadunidense, nossos camaradas do Partido Tudeh se posicionaram pelo apoio à sua burguesia e ao reacionário governo iraniano na guerra imperialista promulgada pelos EUA e Israel, o que rapidamente apoiamos e prestamos solidariedade. Um marxista vulgar certamente poderia ver com maus olhos essa atitude de apoio à burguesia como submissão ou subordinação em nome do combate ao imperialismo.

Porém, na luta contra a agressão imperialista, numa guerra de libertação nacional (distinta, portanto, de uma guerra interimperialista), a burguesia é forçada a armar o proletariado e dar-lhe distintas condições organizativas, treinamento e até controle territorial. Um partido revolucionário nessas duras condições possui, porém, a oportunidade de organizar-se independentemente e elevar a consciência dos trabalhadores para que ao final da agressão livrem sua nação não apenas do imperialismo invasor, mas também de seus próprios burgueses.

Para isso, não é possível em primeiro momento romper a unidade nacional, deixar de combater ao lado da burguesia, ou pior, auxiliar a desestabilização do governo conforme os desejos dos imperialistas. Nesse caso, combater a agressão imperialista ao lado da burguesia é o caminho para o desenvolvimento e reforço da organização independente do proletariado para que, num segundo momento, volte os fuzis contra seus inimigos dentro do país. Sem essa diferenciação tática mantendo a clareza estratégica, o PC poderia ser um mero peão do imperialismo, frustrando qualquer possibilidade de organização independente.

Por outro lado, numa guerra interimperialista, como ocorre hoje na Ucrânia, onde os blocos imperialistas disputam não a soberania de uma nação, mas a partilha das zonas de influência, recursos e mercados, os comunistas devem tomar não uma posição “chauvinista”, mas lutar sem trégua pela derrubada de ambos os governos e a tomada do poder. Nesses casos, é impossível a unidade nacional com governos que envolvem seus trabalhadores na carnificina por interesses alheios, e qualquer tentativa de unidade nacional é nada mais do que a submissão dos trabalhadores à uma ou outra burguesia, inflando o chauvinismo e elidindo a consciência internacionalista de classe.

Nesses casos, a palavra de ordem dos comunistas é a transformação da guerra imperialista em guerra civil, desenvolvendo uma política para, aproveitando que a burguesia armou os trabalhadores para matar seus irmãos, voltar estes fuzis ao inimigo interno, encerrando a guerra não com a vitória de um ou outro bloco, mas com a tomada do poder.

A revolução de outubro só foi possível porque Lênin soube combinar com maestria as duas táticas acima e desenvolvê-las, em toda a hipótese e em qualquer conjuntura, para o benefício do proletariado.

Quando eclodiu a guerra mundial interimperialista de 1914, os bolcheviques foram o único partido a manter a firmeza nos princípios internacionalistas do socialismo científico e a lutar contra o czarismo em seu país, o que levou à uma dura repressão sobre o Partido e o exílio de seus deputados na Duma. Mas, nessa oportunidade, os bolcheviques estiveram ao lado das massas trabalhadoras de todo o mundo que exigiam a paz, o fim da guerra interimperialista, e que cada vez mais se convenceram pela experiência da guerra da justeza da posição bolchevique. Mesmo após a revolução de fevereiro e o estabelecimento de um governo provisório “progressista” na Rússia, os bolcheviques mantiveram firme a reivindicação da saída imediata da guerra e organizaram o proletariado com independência de classe e firmeza de princípios.

Porém, no momento em que o czarismo ameaçou um golpe militar contra o governo provisório burguês através do general Kornilov, longe de se esquivar do combate, os bolcheviques se prontificaram imediatamente a defender esse governo, mas com isso não desenvolveram qualquer agitação ou ilusão a favor da democracia burguesa ou do governo provisório mas, pelo contrário, utilizaram a oportunidade para armar o  proletariado e demonstrar com sua atividade que somente os bolcheviques eram capazes de erradicar o czarismo e encerrar a guerra, e que somente a construção do socialismo seria capaz de erradicar o czarismo, conquistar a paz e implementar as principais medidas para a população.

Nas mais diferentes situações, nas mais diferentes conjunturas, o partido de Lênin lutou contra o imperialismo, pela independência de classe e pela hegemonia do proletariado. É esse o exemplo que seguimos e, se mantivermos a firmeza ideológica e não vacilarmos frente às nossas tarefas, nossa vitória, como a dos bolcheviques há 100 anos, será inevitável.