A escravidão e a luta pela terra no sul do Amazonas
O prefeito de Lábrea (AM), Gean Campos de Barros (MDB), foi condenado a 15 anos e 9 meses de prisão pela exploração de 37 trabalhadores em condições análogas à escravidão na colheita de castanha-do-pará.
Por Redação
O prefeito de Lábrea (AM), Gean Campos de Barros (MDB), foi condenado a 15 anos e 9 meses de prisão pela exploração de 37 trabalhadores em condições análogas à escravidão na colheita de castanha-do-pará, no Castanhal Nova Glória, localizado às margens do Rio Tumiã, na zona rural de Lábrea, sul do Amazonas. A sentença foi proferida no dia 3 de maio pelo juiz Thadeu José Afonso, da 2ª Vara Federal Criminal do Amazonas.
A exploração foi descoberta durante uma fiscalização do Ministério do Trabalho realizada em março de 2014. Na ocasião, foram encontrados 28 adultos (27 homens e uma mulher) e nove adolescentes e crianças em condições degradantes. Os trabalhadores eram forçados a carregar sacos de castanhas em trilhas na mata e a manusear facões longos, conhecidos como terçados, para abrir os ouriços das castanhas.
Gean de Barros, latifundiário e membro do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), executava práticas desumanas, aplicando os piores métodos usados no período do colonialismo europeu e da escravidão. Em sua propriedade, homens, mulheres e crianças trabalhavam sem qualquer equipamento de proteção, sem acesso ao mínimo para sobreviver. A presença de crianças, algumas com apenas 11 anos, mostra a crueldade e o desprezo pela vida humana na busca incessante pelo lucro.
Conforme a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), os trabalhadores não tinham acesso a atendimento médico, instalações sanitárias ou água potável. Além disso, mercadorias eram vendidas a preços exorbitantes, sendo os valores descontados dos pagamentos dos empregados. Não havia pagamento regular de salários, apenas um pequeno valor ao final da safra, o que caracterizava a exploração como trabalho análogo à escravidão.
Para reparar os danos, Gean foi condenado a pagar uma multa de pelo menos R$ 50 mil para cada trabalhador adulto e R$ 100 mil para cada menor de idade, valor ínfimo perto dos lucros exorbitantes que com certeza teve, chegando a beirar o escárnio.
Além da pena de reclusão, ele perdeu o cargo de prefeito e teve seus direitos políticos suspensos, embora possa recorrer em liberdade. O processo também mencionou a participação de Manoel Bento Crispim, que atuava como gerente da propriedade. No entanto, ele não foi localizado pela Justiça, resultando no desmembramento do seu processo.
Apesar dos crimes hediondos, Gean Campos de Barros levou 10 anos para ser condenado. Foram necessários diversos crimes que resultaram em diversos processos jurídicos-administrativos para que seu poder político-econômico diminuísse, permitindo que as pessoas sob seu controle obtivessem a “liberdade”.
Por ser de fácil acesso, qualquer um que pesquise o seu nome na internet, ou procure diretamente nos portais de informações públicos e privados, achará uma série de processos penais aplicados pelo Ministério Público ao latifundiário. Como em 2012, por improbidade administrativa com ausência de prestação de contas de recursos públicos federais.
A Justiça Federal recebeu a ação e julgará o caso, gerando um prejuízo de quase R$ 300 mil aos cofres públicos. Também com o favorecimento de empresas de combustíveis e contratos milionários em 2022 e em 2023, ele foi condenado à prisão e inelegibilidade por sumir com 1 milhão do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Impunidade? Despreparo? Ou um projeto sistemático?
A exploração promovida por Barros não é um caso isolado, mas sim reflete o modo de produção capitalista que domina a Amazônia, onde a terra e os recursos naturais são controlados por poucos, enquanto a maioria é condenada à miséria e ao trabalho extenuante.
A exclusividade na compra das castanhas obtidas por meio de trabalho escravo e o financiamento de atividades ilegais mostram como a acumulação de riqueza está ligada a práticas criminosas e desumanas. Os atores apenas mudam de tempos em tempos, mas os protagonistas são sempre a classe burguesa local, que serve como lacaio e executor, e a burguesia internacional, que financia com seu capital tais manobras criminosas.
Como foi reportado pelo jornal A Nova Democracia, os camponeses organizados e conscientes de sua condição enfrentam a violência de pistoleiros. A mando dos grileiros latifundiários Sidney Sanches Zamora e Sidney Sanches Zamora Filho, eles usaram da intimidação, tortura e sequestro para roubar terras públicas da União, ocupadas por cerca de 200 famílias de camponeses.
A prisão injusta do dirigente camponês Paulo Sérgio Costa de Araújo é uma tentativa desesperada da burguesia de suprimir qualquer resistência organizada. Mesmo sem provas de que realmente possuíam aquelas terras, os latifundiários conseguiram o mandado de prisão do dirigente camponês. A luta camponesa em Lábrea, exemplificada pela resistência da Comunidade Marielle Franco, é a resposta a essa opressão.
Uma matéria da Repórter Brasil destaca como homens na Amazônia são forçados a cortar árvores em condições perigosas, sob risco constante e ameaças de violência. Esses trabalhadores camponeses e indígenas enfrentam situações de extrema precariedade, com jornadas extenuantes e falta de qualquer proteção, evidenciando a continuidade das práticas escravistas na região.
A Amazônia é especialmente vulnerável ao trabalho escravo, devido à sua vasta extensão, baixa densidade populacional e fraca presença do Estado, fatores que facilitam a exploração dos trabalhadores em situações de extrema precariedade.
Além disso, conforme relatado pelo Brasil de Fato, Lábrea também se tornou um epicentro do desmatamento na Amazônia, impulsionado principalmente pela pecuária. A transformação de áreas florestais em pastos tem causado a destruição de vastas áreas de floresta e a prática da grilagem, onde terras são ilegalmente ocupadas e revendidas, também contribui para o avanço do desmatamento. Essa combinação de desmatamento desenfreado e exploração humana ilustra claramente os efeitos devastadores do capitalismo na Amazônia.
A exploração no município foi agravada pela pandemia de COVID-19, que expôs ainda mais a vulnerabilidade da população local. Relatos de trabalhadores escravizados durante a pandemia mostraram como a crise sanitária foi usada para intensificar a exploração e manter os trabalhadores em condições desumanas, sem acesso a cuidados médicos adequados.
A realidade de Lábrea faz parte de um cenário mais amplo de exploração na Amazônia, uma região que, segundo o Repórter Brasil, tem a maior incidência de trabalho escravo no país, evidenciando a persistência das práticas de exploração mais brutais em áreas de fronteira agrícola e recursos naturais.
A lógica capitalista predatória, que visa à acumulação de riqueza para poucos à custa da degradação humana e ambiental, é uma constante na história da exploração amazônica. Enquanto o “desenvolvimento econômico” avança, ele ocorre às custas do meio ambiente e dos direitos humanos, que às duras custas foram conquistados ao longo da formação do Estado Burguês Brasileiro. A luta dos camponeses, indígenas e quilombolas por dignidade e justiça continua sendo travada diante dos grandes desafios impostos por aqueles que lucram com a exploração da terra e das pessoas.
Assim, a situação de Lábrea é um exemplo da luta de classes que permeia a sociedade brasileira. A exploração brutal dos trabalhadores e a resistência camponesa são expressões da contradição fundamental entre capital e trabalho. A libertação das massas oprimidas só será possível através da união dos trabalhadores da cidade, do campo e das florestas, em uma frente revolucionária que busque a derrubada do sistema capitalista e a construção de uma sociedade socialista, abolindo essa política de senhores de escravos que se arrasta nestas terras desde a invasão europeia.
Para isso, os meios de produção devem ser coletivizados e a exploração do homem pelo homem deve ser abolida por meio da expropriação e nacionalização de todas as terras rurais e urbanas, garantindo o direito de usufruto de suas moradias, lavouras, etc. Que todos os pequenos proprietários, agricultores familiares e comunidades tradicionais possam desempenhar suas atividades com a garantia de uma vida plena, que respeite e permita o desenvolvimento pessoal e coletivo com uma produção baseada em uma economia planificada para as pessoas e a natureza.