A Deterioração Gradual da Soberania Nuclear Brasileira: Um Alerta Vermelho!

Essa dependência que temos do mercado estrangeiro é incentivada, ao invés de ser sanada. O Brasil possui tecnologia e recursos para ser autossuficiente em urânio, contudo, não há incentivo do Estado para fomentar pesquisas e um maior desenvolvimento industrial na área

A Deterioração Gradual da Soberania Nuclear Brasileira: Um Alerta Vermelho!
A verdadeira ameaça vem da privatização, que historicamente degrada as condições de trabalho e ignora protocolos de segurança, colocando em risco a vida dos trabalhadores, do meio ambiente e das comunidades ao redor.

Por Ive e Pedro

O programa nuclear brasileiro enfrenta um ataque silencioso e insidioso. A PEC 122/2007[1] permite a construção e operação de reatores nucleares por empresas privadas e foi aprovada em 2019, pela CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) da câmara dos deputados. Atualmente, está aguardando votação no plenário, última etapa do processo. Esta PEC coloca nossa segurança energética, física, ambiental e a soberania nacional à mercê dos lucros, muitas vezes estrangeiros e faz parte de um projeto de privatização do programa nuclear brasileiro.

A PEC retoma uma temática que veio à tona no processo de privatização da Eletrobras em 2022. Na época, uma questão em aberto era a situação do gerenciamento das usinas nucleares de Angra I e Angra II, pois, pela Constituição brasileira, a atividade nuclear é monopólio da União. Sendo assim, foi criada a ENBPar, o braço estatal da Eletrobras[2]. Com a alteração da PEC, seria retirado o monopólio da União na geração de energia elétrica pelas usinas nucleares, possibilitando uma total privatização do setor energético e caminha para a privatização do programa nuclear brasileiro, já que esta PEC não é um ataque isolado.

Atualmente, a INB (Industrias Nucleares Brasileiras) detém o monopólio estatal de venda e utilização do urânio, realizando o ciclo de combustível de urânio, para fornecer pastilhas de combustível às usinas de Angra dos Reis. A única etapa que não é realizada no Brasil é a conversão, processo que prepara o urânio minerado para o enriquecimento[3]. O que significa que o Brasil precisa importar hexafluoreto de urânio (UF6), resultado do processo de conversão. Uma brecha que impossibilita que o ciclo seja fechado e seja 100% nacional, mesmo que isso possa ser possível e impossibilita que sejamos autossuficientes.

Acontece que até 2022 a INB possuía também o monopólio da mineração de urânio, porém empresas privadas foram permitidas de realizar essa atividade no governo fascista Bolsonaro-Mourão. Isto ocorreu com a MP 1333/2022[4] convertida em lei às pressas pelo congresso, no mesmo ano. Estas empresas privadas fornecem urânio à INB, já que, por enquanto, ainda não podem vender ao mercado externo. Há o intuito do Brasil se tornar exportador de Urânio[5], para ser vendido como matéria-prima para os programas nucleares de outros países, o que reforça o caráter dependente de nosso país.

Essa dependência que temos do mercado estrangeiro é incentivada, ao invés de ser sanada. O Brasil possui tecnologia e recursos para ser autossuficiente em urânio, contudo, não há incentivo do Estado para fomentar pesquisas e um maior desenvolvimento industrial na área. O governo está entregando nosso patrimônio nuclear nas mãos do capital privado, tanto nacional quanto estrangeiro, como argumento falacioso de falta de tecnologia e falta de financiamento, uma de várias das consequências prejudiciais da austeridade fiscal. É conveniente para outros países que seja aberto em maior escala a exportação de urânio, beneficiando a lógica imperialista, pois as reservas de urânio são escassas e o Brasil é o país que possui a sétima maior reserva de urânio no mundo.

Apesar de ser necessário os avanços na construção de usinas nucleares com as novas tecnologias disponíveis, para a transição energética, isso só é assegurado, se realizado pelas indústrias estatais. Somente assim seria garantida a soberania brasileira. A análise ambiental, sobre sua localidade, a segurança dos pesquisadores, técnicos, mineradores e demais trabalhadores, com a privatização, estará submetido a garantir as taxas de lucro da empresa. Exemplos fatídicos não faltam, tendo em vista os impactos ambientais e humanitários causadas pela Vale, em Brumadinho e Mariana, e pela Braskem, em Maceió, região com risco do solo colapsar devido à mineração de sal-gema, impactando mais de 50 mil pessoas.

A verdadeira ameaça vem da privatização, que historicamente degrada as condições de trabalho e ignora protocolos de segurança, colocando em risco a vida dos trabalhadores, do meio ambiente e das comunidades ao redor, como evidenciado pela Vale e Braskem, o que seria ainda mais catastrófico se se tratassem de minas de urânio ou usinas de energia nuclear.

Ceder o controle do nosso programa nuclear para entidades privadas, principalmente estrangeiras, é renunciar à nossa soberania nacional. A decisão de terminar o monopólio estatal e abrir o setor a investidores privados alterará drasticamente o cenário energético e de segurança nacional do Brasil, subjugando ainda mais nossos trabalhadores ao capital estrangeiro. Tanto a mineração, quanto a produção de combustível e de energia em reatores nucleares devem estar sob controle estatal. Não podemos permitir que a vida dos trabalhadores brasileiros seja sacrificada no altar da ganância privada. A tecnologia nuclear é estratégica, essa tecnologia deve estar nas mãos do Estado e ele deve se responsabilizar pela desmitificação dos perigos das usinas nucleares com políticas consequentes de incentivo à pesquisa.


Referências:

[1]https://www.lexml.gov.br/urn/urn:lex:br:camara.deputados:proposta.emenda.constitucional;pec:2007-07-12;122

[2]https://congressoemfoco.uol.com.br/area/governo/privatizacao-da-eletrobras-torna-incerto-programa-nuclear-brasileiro/

[3] https://www.inb.gov.br/Nossas-Atividades/Ciclo-do-combustivel-nuclear

[4] https://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/154474

[5]https://www.gov.br/pt-br/noticias/energia-minerais-e-combustiveis/2020/12/brasil-retoma-producao-de-uranio